12 de janeiro de 2019

Peter McEachern Trio “Bone-Code” (Clean Feed, 2018)


Sabem o que chamar a uma bela mulher agarrada ao braço de um trombonista? Uma tatuagem. E a definição de otimista? Um trombonista com um agente. A diferença entre um pugilista e um trombonista? Não é suposto um trombonista infligir dor. Enfim, a coleção de anedotas do tipo é infinita e Peter McEachern já as ouviu a todas. Algumas, até, da boca do seu falecido sogro, Norman Mailer (Peter é casado com a artista plástica Danielle Mailer, filha do escritor), aquele que, em 1957, pariu uma coisa tão estereotipadamente grotesca quanto esta: “O negro não permitiu a si próprio as sofisticadas inibições da civilização e, como tal, adotou a arte primitiva enquanto estratégia de sobrevivência, passando a viver num enorme presente, entregando-se aos prazeres do corpo em detrimento dos da mente e dando expressão através da música às qualidades da sua existência, à sua raiva e às infinitas variações de alegria, luxúria e raiva do seu orgasmo, pois o jazz é um orgasmo.” Credo. 

Citação por citação, McEachern certamente preferiria adotar a máxima repetida por Bob Brookmeyer a propósito dos membros de uma big band e reivindicar para si aquilo que Mailer nem em teoria consentia aos outros: “Os saxofonistas engatavam as miúdas todas porque estavam sentados na primeira fila, os trompetistas metiam o dinheiro ao bolso porque dirigiam as operações desde a fila de trás e os trombonistas ficavam no meio a desenvolver uma vida interior.” Aliás, McEachern invoca de forma tão sensível a esfera paroquial em que o jazz foi inicialmente batizado que ouvi-lo quase obriga a rever os livros de História – é como comparar a maneira tradicional de retratar o Homem de Neandertal com a descrição que dele faz Steven Mithen em “The Singing Neanderthals” (do seu modo de comunicação “holístico, manipulativo, multimodal, musical e mimético”, ou HMMMMM). Isto, porque McEachern descobriu recentemente possuir mais ADN em comum com o Neandertal do que 93% da população testada, daí este seu título. Então, pega no trombone, encosta o bocal aos lábios, faz hmmmmm e o jazz volta à posição ereta. Esta, nem o Mailer.

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