Um dos mais sugestivos álbuns de 2011
foi “Science of the Sea”, reedição da música criada, em 1979, pelo biólogo
marinho Jürgen Müller para servir de banda-sonora em filmes com expedições
subaquáticas. Numa diáfana tessitura tão sedante quão sujeita a espumosos
arpejos, dir-se-ia a mais poética representação do mar desde Debussy. Mas tratava-se
de uma efabulação, imputada, desde então, ao produtor contemporâneo Panabrite. O
seu ato de imaginação – mas, mais ainda, uma receção que indicia que os
melómanos preferem boas estórias a boa música – trazia à memória a frase com
que, em 1935, Fritz Kreisler, após assunção de que tinha sido ele, de facto, o
autor de peças atribuídas a Couperin ou Vivaldi, respondeu aos reclamantes:
“podem mudar o nome que o valor se mantém o mesmo”. Ou seja, substituiu uma
fabricação universal, reconhecida como autêntica, por outra particular, logo
tida como falsa. Mas o que estes testemunhos apócrifos provam é que sem eles
não se compreende totalmente o contexto histórico a que se referem, nem, muito
menos, aquele em que são gerados – além de possuírem semelhante importância
devocional à que se desenvolve na apreciação do dogma. Talvez por isso, inexcedíveis
em vaidade e descaramento, reincidam uns ampliados MOPDtK (adicione-se Brandon
Seabrook, Ron Stabinsky e David Taylor a Moppa Elliott, Kevin Shea, Jon
Irabagon e Peter Evans) na ‘arquivologia mágica’, reavivando aqui a obra dos
ficcionais Brimstone Corner Boys, cuja atividade escrutinam num livreto que
cruza lendas da Grande Depressão com relatos de combustão humana espontânea e evocações
das cidades-fantasma da Pensilvânia. O modelo – atente-se numa capa que
mimetiza a da antologia “Birth of the Hot” – é o dos Red Hot Peppers, de Jelly
Roll Morton, nivelados pelo rolo compressor de décadas de convulsões artísticas.
Perfeitamente voltaico.
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