13 de maio de 2017

Harris Eisenstadt Canada Day Quartet “On Parade in Parede” (Clean Feed, 2017)


A gravação tem origem num par de concertos que Harris Eisenstadt, Nate Wooley, Matt Bauder e Pascal Niggenkemper deram no sótão da Sociedade Musical União Paredense, a 30 de abril e 1 de maio de 2016, mais ou menos a meio de uma breve digressão europeia. Daí o trocadilho do título, claro, e a manipulação na capa do CD de uma emblemática foto de finais da década de 50 da praia da Parede, do espólio do Estúdio Horácio Novaes, pertencente à coleção da Biblioteca de Arte da Fundação Calouste Gulbenkian. Ora, como é óbvio, pode haver alguma serendipidade à mistura, mas a verdade é que também a música do quarteto remete para o tempo desses retratos a preto e branco (não obstante se dar a conhecer através de títulos inspirados em programas televisivos como “Downton Abbey” ou “True Detective”). Aliás, numa entrevista ao “All About Jazz”, publicada em outubro de 2009, Eisendstadt admitia que “a existir algum tipo de arquétipo para este grupo [“Canada Day”, o primeiro do que, até 2015, viriam a ser quatro volumes de constituintes algo variáveis, tinha, então, sido editado pela Clean Feed], será que ele representa a minha declaração de amor ao quinteto de Miles Davis filtrado pelos discos da Blue Note dos anos 60 com o piano substituído pelo vibrafone [de Chris Dingman, pela primeira vez ausente num registo subordinado à ação da banda].” O baterista concluía que, em termos de orquestração, não se tratando de “uma formação grande, nem pequena, era uma combinação perfeita entre a escassez e o excesso.” 

Obedecendo-se a alguma regra de conduta, aqui, será essa – embora se prove eminentemente contemporânea, a responsabilidade moral dos instrumentistas que continuamente questionam, contrariam e confirmam os procedimentos coletivos. Algo que se verifica de modo exponencial no contraponto entre trompete e saxofone, quando se dão ritmos cruzados ou se desliza para uma harmonia mais oblíqua ou se abre as portas ao exotismo (no caso, o afrobeat) e se reduz a uma chuva de saliva o que tinha começado numa sublime linha melódica. Mais do que adesão, ou não, à convenção, trata-se de disputar a unidimensionalidade da expetativa. Agora, como na década de 50. Na Parede, como em Nova Iorque.

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