8 de dezembro de 2017

Seong-Jin Cho: Debussy (Deutsche Grammophon, 2017)



Em 2014, com 19 anos, o sul-coreano Seong-Jin Cho cruzava diariamente a esplanade do Musée d’Orsay, em Paris, e sentia-se no centro do mundo. A justificá-lo, em formação, ao fundo da praça, as estátuas dos seis continentes, criadas para a Exposição Universal de 1878, com Europa e Ásia ao lado uma da outra: “[Entrava e] Chegava a passar meia hora, ali, sentado, a olhar para um dos nenúfares de Monet”, diz. Podia não parecer, mas tratava-se de uma visita de estudo. E a imagem que salta imediatamente à memória é a de Claude Debussy, em 1889, noutra Exposição Universal, a dedicar “horas muito produtivas à kampong [aldeia] javanesa, atento à polirritmia percussiva de um gamelão que dava mostras de ser inesgotável em matéria de combinações de timbres etéreos ou fulgurantes”, contava Robert Godet. “Ele também adorava arte japonesa”, prossegue Seong-Jin, num depoimento recolhido pela sua editora, “em que a perspetiva é tratada de uma maneira completamente diferente da ocidental e em que aquelas partes da tela deixadas em branco têm um significado importante – como as pausas na sua música”. 

Refere-se à palavra japonesa Ma (“intervalo”, “espaço”, “tempo”), o jovem pianista, cuja aplicação prática, um dia, foi sintetizada nas páginas de “Japan Architect” por Arata Isozaki nestes termos: “Ma é um alinhamento de sinais – um lugar vazio onde todo o tipo de fenómenos aparece, passa e desaparece.” Conforme lembrou Mallarmé, em cuja poesia Debussy tanto se inspirou: “Nomear um objeto equivale a suprimir três quartos do gozo de um poema… [Já] Sugeri-lo, é um sonho.” Esta forma alusiva, evocativa e simbólica de proceder guia Seong-Jin pelas seis peças de “Images”, por “Children’s Corner”, “Suite bergamasque” e “L’Isle joyeuse”, e atrasa os ponteiros do relógio para o tempo de Gieseking (gravada entre 1951 e 1955, a sua integral de Debussy foi reeditada este ano) ou, quiçá, para o de Benedetti Michelangeli, dois que honraram a ambição do compositor em escrever para um “piano sem martelos”, líquido, quase gasoso. E eis que retorna, esse Debussy, envolto em incensos e sedas perfumadas.

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