7 de julho de 2018

Agenda: Jazz no Parque, Funchal Jazz, Guarda in Jazz, Julho é de Jazz

Arranca o “Jazz no Parque”, em Serralves, onde, diz Rui Eduardo Paes (o programador), se vão apresentar “três projetos que contrariam a separação entre o que se considera mais acessível e popular e o que é remetido para o chamado experimentalismo”, gente que pratica “músicas que fazem bater o pé e abanar a cabeça sem que tal implique uma menor preocupação com as questões estéticas ou uma atitude menos inconformista”: refere-se ao sexteto liderado pelo guitarrista Mané Fernandes (hoje, como sempre, às 18h), ao quinteto da baterista Lucía Martínez (dia 14) e aos Naked Wolf (21), em que pontifica Luc Ex. O objetivo, então, será desfazer de uma vez por todas aquela velha e nada lícita divisão de conceitos que Paes caracteriza desta forma: “Uma especial atenção ao balanço rítmico significa frequentemente, e logo à partida, que não há uma atitude de inovação de linguagens ou vice-versa.” O que está errado, claro, conforme provou com frequência a figura que domina a agenda desta semana: o baterista Billy Hart, que dá quatro concertos com Joshua Redman, Ben Street e Ethan Iverson entre nós (dia 10 na Casa da Música, dias 11 e 12 no Hot Club e dia 13 no “Funchal Jazz”).

Aliás, esta questão do ritmo traz à memória uma entrevista que Iverson fez há uns anos a Hart (e que publicou no seu site) e na qual teve a extrema delicadeza de não perguntar quase nada. Pelo contrário, conversavam e o pianista contentava-se por sugerir uns tópicos e por fazer uns comentários em jeito de aparte. Pode dizer-se que falavam como tocavam, com Hart a superar os limites da imaginação e a transportar Iverson para uma era de feitos inacreditáveis no jazz e na vida. “Sei que, na altura, quando comecei a aparecer, o mais importante era encontrar o [meu] próprio som”, dizia. “Se não o [meu] estilo, pelo menos o [meu] som.” Depois, como quem sabe ter testemunhado milagres, falava de Louis Hayes ou de Tony Williams: “O Tony conhecia bem [o andamento da] segunda linha [das marchas de Nova Orleães]. A tradução direta dos ritmos africanos para a tarola.” Não admira que, a certa altura, Hart se refira ao jazz desta maneira: “Esse universo imenso que é como um grande avanço sociológico demonstrado pela música.” 

Até porque muito daquilo que implica de mais significativo dá mostras de desafiar a comunicação verbal: “O que mais me surpreendeu na banda do Coltrane foi o Elvin Jones. Ia vê-lo todas as noites [em que o grupo de Coltrane atuou no Bohemian Caverns, em Washington, onde Hart vivia]. No fim, (…) nem me conseguia mexer, como se estivesse preso em cimento. Ficava a olhar para o Elvin. Chamou-me, e disse: Não me peças para te mostrar seja o que for, porque [se isto pudesse ser ensinado] seríamos todos como o Max Roach.” Ora aí está alguém que Hart considera “próximo da fonte”, que trouxe para o jazz uma espécie de verdade elementar a nível rítmico: “O ritmo é tão importante quanto a harmonia na história da evolução humana. Mas na Europa estabeleceu-se um vínculo tão profundo entre harmonia e emoção que parecia não haver outro modo de fazer as coisas”, concluía. Claro que, hoje, tudo mudou. Basta prestar atenção a alguns dos outros nomes que vão ao festival madeirense: a Vijay Iyer (que tocará com o seu estelar sexteto dia 13, às 21h30, antes de Hart subir a palco), ao trio de Dave Holland, Chris Potter e Zakir Hussain (dia 14, às 21h30) e ao de Jason Moran (14; 23h). E, como é óbvio, à antiga banda de Iverson, os Bad Plus (em que entretanto se viu substituído por Orrin Evans), que toca dia 11 no Teatro Municipal da Guarda inserida no “Guarda in Jazz” e dia 12 no Gnration, em Braga, no “Julho é de Jazz”, trazendo consigo o redundantemente intitulado “Never Stop II”. Nesse mesmo ciclo, dia 13, toca Pulverize the Sound (de Peter Evans, Tim Dahl e Mike Pride), uma daquelas formações em que assenta que nem uma luva outra frase de Hart tirada da entrevista a Iverson: “Tenho tanta fé na tradição que acredito numa solução lógica até mesmo para a música mais fora.” Elementar.

Sem comentários:

Enviar um comentário