11 de fevereiro de 2017

Studio One Rocksteady Volume 2: The Soul of Young Jamaica (Soul Jazz, 2017)


Em notas de apresentação, Steve Barrow, eminente cronista, historiador e zelador da narrativa audiovisual jamaicana, esclarece que “este repertório procede direta ou indiretamente da música soul norte-americana dos anos 60”, não obstante, a espaços, certos temas transitarem da condição de imigrantes a indígenas. Não está equivocado, claro. E não há assim tanta gente a saber da poda como ele. Afinal, em 2001, na sua Blood and Fire, coligiu a obra-prima do género: “Darker than Blue: Soul from Jamdown 1973-1980”. Mas, já agora, convirá adiantar que nem tudo o que aqui se escuta é derivativo. Além de que no turbilhão social da Kingston do período emerge uma diáspora urbana capaz de assimilar modas em anos de gato. Curiosamente, por entre tamanha vertigem, o rocksteady tratava de refrear o ímpeto do ska, permitindo, entre inúmeras outras coisas, a emancipação do baixo na secção rítmica e a introdução na lírica de assuntos dignos de ilustrar as dores de crescimento de uma nação que se libertava do poder paternal. Nessa perspetiva, o Studio One, de Clement “Coxsone” Dodd, era simultaneamente consumidor e produtor de uma nova cultura que se projetava como mundana, moderna e em constante movimento. Ouçam-se, aqui, Alton Ellis (e a sua irmã, Hortense), Owen Gray, Slim Smith, John Holt (a solo e com os Paragons), Larry Marshall, Heptones, Gaylads ou Delroy Wilson que logo se entenderá o impulso básico daqueles que convertiam estímulos exteriores em experiências pessoais, dos que se entregavam ao licencioso prazer da construção da identidade. Ou seja, Dodd e os seus acólitos não se limitavam a olhar com inveja para a música soul. Estavam igualmente a fazê-la. Nem se adaptavam por mimetismo a uma realidade importada. Participavam, isso sim, de um ato de imaginação coletivo que tinha, ainda, a vantagem de ser idealizado para as noites de baile: passado, presente e futuro subitamente materializados no corpo de um casal; memórias, temores e anseios a flutuar sobre a pista de dança.

Sem comentários:

Enviar um comentário