“Gózalo” não poderia arrancar de forma mais inspirada, com um ‘Saludo Maracaibo’, de Pedro Miguel, a passar em revista glórias do panteão afro-cubano como quem degusta pratos de uma conhecida ementa, sabendo que só uma nova receita – no caso, o boogaloo – lhe saciará o apetite. Em ‘Psicosis’, a Sonora de Lucho Macedo ensaia um conto de terror, com passos a ecoar por um casarão vazio, silêncio rasgado por uma gargalhada de fazer gelar o sangue e uma súbita explosão rítmica a lembrar a conga line da família Adams. Depois, percussionistas imunes à tendinite martirizam badalos, jorra champanhe de secções de metais, dá-se um tornado de reco-recos e passa um vendaval de trompetes soprado pelo ar pedido emprestado às bochechas de Dizzy Gillespie. O retrato é excêntrico mas não trai o essencial de um impulso extensível a Coco Lagos, Alfredo Linares ou Ñico Estrada, que se livravam do folclore peruano como se tirassem uma espinha da garganta, abrindo alas à chicha e aproximando-se à música anglo-saxónica e à cumbia colombiana. Dessa, trata “Cartagena!”, acompanhando o percurso de José Maria ‘Curro’ Fuentes – na Discos Curro e enquanto director artístico da Philips – e a acção de Lucho Bermudez, Lalo Orozco ou Pacho Galán, que sugerem andar de olhos vendados por um labirinto onde dorme uma besta: a salsa, que tudo cobriria com fama, fortuna e o manto branco da cocaína.
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