O título
era medonho, mas com a compilação “Noise & Chill Out – Ethiopian Groove
Worldwide” pretendia-se já veicular a ideia de que, conforme o glossário
gastronómico sugere, também na produção musical à escala global se traduz
‘redução’ por intensificação. E, de facto, como em tempos se passava com modas
e ritmos das tradições celta, judaica ou eslava, é mesmo naquele tipo de
enlaces particularmente exogâmicos que mais depressa se identificam demarcadas
características que, muito por culpa da mais rasteirinha antropologia, se
julgavam obrigatoriamente endógenas. Por isso, depois das exumadoras pazadas
com origem na colecção Éthiopiques, é inevitável concluir que, com os mais
improváveis remetentes e com maior ou menor ligação à diáspora, se identificará
com frequência descendentes mais ou menos legítimos da sua estirpe. Basta ouvir
a Debo Band em Boston, a Imperial Tiger Orchestra em Geneva, os Pyramid Blue em
Madrid, a Souljazz Orchestra em Ottawa, a Budos Band em Nova Iorque ou Nicolas
Jaar um pouco por toda a parte para se perceber que o interesse por certa
escala pentatónica ou por determinado modalismo vindos da Etiópia está a
alargar o livro de estilo de importantes tangentes da música popular de forma
mais substantiva do que, dado o maná extraído e logo deglutido por Kanye West,
Jay-Z, Madlib ou Nas em discos de Mulatu Astatke, por exemplo, à primeira vista
poderia parecer. É nessa perspectiva – embora com estreitas ligações à
comunidade emigrante – que se deve compreender a vibrante estreia do londrino
trio Krar Collective, liderado por Temesgen Zeleke nas lira, rabeca e flauta
etíopes, e com o percussionista Robel Taye e a cantora Genet Assefa, numa
expansão praticamente psicadélica do depurado legado de Asnakech Worku,
acessível, contagiante e, como não poderia deixar de ser, já nem daqui nem de
acolá.
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