7 de janeiro de 2017

Rihm, Dusapin, Mantovani: Violin Concertos (Erato, 2016)


Numa alocução feita em 1938, Max Beckmann falava acerca do que o levava a pintar: “Desejo mostrar o que se esconde por detrás daquilo a que chamamos realidade. […] O que vai do visível ao invisível.” Não se podendo dizer que se lhe deteta a influência da dialética talmúdica, “Gedicht des Malers”, de Wolfgang Rihm (n. 1952), foi em alguns aspectos inspirado pelos quadros de Beckmann. Ou melhor, para compor este concerto para violino e orquestra, Rihm imaginou Beckmann a fazer o retrato de Ysaÿe. Estamos no domínio do arquetípico. E há outra frase do pintor que se adivinha importante na sua conceção: “Na grande arte dá-se sempre a conjunção da sensualidade artística com a objetividade.” Dedicado a Renaud Capuçon (aqui acompanhado por Philippe Jordan, à frente da Sinfónica de Viena), o expressivo mas enigmático concerto, de um andamento só, surge marcado pela ambição de ver para lá dos cabalísticos “véus da existência negativa” a que Beckmann também aludiu. Escutá-lo é como ter acesso a partes de um sonho cujos limites servem apenas para que se intua a efetiva dimensão do inatingível. 

Não menos metafórico, ao apresentar “Aufgang”, Pascal Dusapin (n. 1955) afirma que o ato de “escrever um concerto para violino e orquestra pode ser comparável à luta entre luz e escuridão”, que é como invocar “o anoitecer e a alvorada ao mesmo tempo”. Ou seja, “Aufgang” nasceu do desejo de conciliar opostos partindo dessa ideia de iluminar as trevas através do violino de Capuçon (igualmente dedicatário do concerto e segundado por Myung-Whun Chung e pela Filarmónica da Radio France). Em três andamentos, possui um elemento exótico – uma flauta tocada de forma a tornar audível o sopro excedentário e capaz de trazer à memória, por exemplo, a música de Morricone para “A Missão” – mas trata essencialmente de fazer entrelaçar melodia e harmonia, cor e textura. Por fim, “Jeux d’eau pour violon et orchestre”, de Bruno Mantovani (n. 1974), mais uma vez oferecido a Capuçon (com Jordan e, desta feita, a Orquestra da Ópera de Paris), vem, segundo o compositor, de uma “área de transição” (entre música e som, presume-se). De melodias contínuas, recorrendo por vezes a modelos imitativos em fluxo e refluxo, trata-se de uma peça em transformação constante. Em todas, um intérprete em estado de graça.

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