4 de fevereiro de 2017

Rodrigo Amado Motion Trio "Desire & Freedom" (Not Two, 2016)




Em 1987 tocava naqueles conjuntos que pareciam de geração espontânea mas que eram tudo menos isso: atuou no Rock Rendez-Vous com os SPQR, ao lado de Rafael Toral e de José Pedro Moura; apresentou-se na Galeria Monumental com os Croix Sainte; deu concertos no Teatro do Século e no Ritz Clube em formações lideradas por Sei Miguel. 30 anos depois, editado este “Desire & Freedom”, críticos de todo o mundo falam de Rodrigo Amado como um sobrevivente das guerras paroquiais da New Thing, entretido a lamber as suas feridas, quando, na realidade, a sua ambição terá sido sempre a de iludir o provincianismo. Da mesma forma, nas mais variadas publicações, Lisboa é atualmente representada como um epicentro de novas músicas quando, grosso modo, o que se deu foi mais uma reformulação nas estruturas com que a cidade ciclicamente acomoda estímulos exteriores. Dir-se-ia que nesse trânsito permanente ele é dos poucos a receber e a enviar sinais nos dois sentidos. Conseguiu-o através de uma prática algo solitária e vagamente descontínua, arranhando línguas estranhas em processos de composição menos orgânicos do que aqueles que desejaria, supõe-se. Mas o seu crescimento foi exponencial, mais pela sucessiva agregação de camadas à superfície do que por outra coisa qualquer. Hoje, principalmente se acompanhado por Miguel Mira e Gabriel Ferrandini no Motion Trio, ao improvisar livremente, sugere, aliás, estar a aproximar-se do ponto de superação de um obstáculo que de tempos a tempos se intrometia no seu caminho e que vinha da frustração de encontrar limites na linguagem que tinha escolhido para si. Ou melhor, de sentir que nem sempre acedia àquele estado em que os conceitos que lhe eram mais caros – liberdade, criatividade, espiritualidade – se mostravam inteiramente adequados ao que fazia. Agora, pelo que tem dito em entrevistas, percebe-se que foi pelo reconhecimento da importância da responsabilidade naquilo que produz que se livrou do dogma. “Desire & Freedom” é o momento em que quebra a barreira do som.

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