“Ah Fellove estavam a tocar o teu Mango Mangué no rádio e a música e a velocidade e a noite envolviam-nos como se quisessem proteger-nos ou enlatar-nos no seu vazio e ela ia ao meu lado, a cantar…”, escreveu Guillermo Cabrera Infante em “Três Tristes Tigres”. E, porque ambos contribuíram para uma certa ideia de diáspora, parece apropriado evocar o nome de um através do outro. Ainda para mais quando representam também uma dimensão relativamente esquecida – senão subestimada – mas essencial na compreensão do sincretismo cubano: a da sátira. Esta antologia de Francisco Fellove Valdés poderá enfim contribuir para a alteração do estatuto do seu titular. Porque, injustamente, permanece uma nota de rodapé nos estudos sobre música latino-americana quem no seu tempo ganhou o epíteto de “El Gran” e, fundamentalmente, porque o que nela se ouve ilustra de forma exemplar décadas de transformação estética. Gravados para a RCA mexicana entre meados dos anos 50 e inícios de 60, estes 21 temas, talvez inadvertidamente, reavivam de forma exaltante velhos cismas nascidos no contínuo frenesi criativo de Havana. E derivam do fundamento rítmico afro-cubano para logo trazer à lembrança guarachas de antigas zarzuelas, combinam rumbas ouvidas nas docas com refinados arranjos para orquestra ao estilo dos espectáculos de Xavier Cugat no “Tropicana”, cruzam mambo e guaguancó, estilizam o bolero e o cubop (Fellove, antes de abandonar a ilha rumo ao México e Nova Iorque, participava nas famosas descargas organizadas por músicos como Israel ‘Cachao’ López), agilizam o son montuno de Septeto Habanero ou Sexteto Nacional, abrandam o cha cha cha e, precocemente, aceleram o boogaloo, ensaiam o doo wop ao jeito dos Zafiros e, essencialmente, servem um vocalista que – entre Louis Armstrong e Cab Calloway – se entregava ao scat como se o tivesse inventado. No mínimo, inesquecível.
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