24 de março de 2012

Edu Lobo "A Música de Edu Lobo por Edu Lobo" (Soul Jazz, 2012)

Parece ter nascido ideologicamente entrincheirado mas, no limite, mais não faz do que articular poeticamente a resistência ao liberticídio. E, à distância, assume de facto a condição genesíaca que tão ufanamente ambicionava. Porque, hoje, a permeabilidade a um discurso político polarizado pelo populismo de esquerda já não tolhe esta estreia de Edu Lobo, editada pela Elenco em 65. Pelo contrário, é antes elementar para uma constatação mais significativa: a de que se operava com este disco uma radical transformação nos ambientes e lugares da bossa nova. Caetano Veloso, que na afirmação estética tropicalista tantas vezes se viu contrariado por Edu, reconheceu, em “Verdade Tropical”, esse impulso de “sair do apartamento para os grandes espaços, do individual para o social, do urbanismo neutro para o particularismo regional” que jamais compromete “um sofisticado harmonista, um melodista inventivo e um estilista de forte marca pessoal”. Aliás, outro programa aqui não se verifica. E a ligação às engajadas produções teatrais de Oduvaldo Vianna Filho, Augusto Boal ou Gianfranceso Guarnieri, como “Opinião” ou “Arena conta Zumbi”, das quais se extraem alguns destes temas, ou a participação nos festivais televisivos, vencendo, em 65, o da TV Excelsior com a interpretação de Elis de ‘Arrastão’, com poema de Vinicius, também incluído neste álbum, são contingências culturais de época que contribuem para o polissémico alcance deste capítulo inaugural. Com o golpe militar de 64 como pano de fundo, desmontam-se aqui signos folclóricos, raciais e nacionais, denuncia-se o messianismo religioso ou o caciquismo, sublima-se a teleologia espelhada nas letras de Ruy Guerra, e, fundamentalmente, ensaia-se, com o Tamba Trio, uma vibrante antevisão dos caminhos que a música popular brasileira haveria de trilhar até ao fim da década.

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