Só um
disco assim – ainda que cá chegando um ano atrasado – conseguiria contrariar a
contínua contração do mercado português face à mais importante música popular
brasileira de hoje. Ajuda, nesse contexto, a formatação clássica de uma
apresentação que tempera repertório original com material de cancionistas
tarimbados (Chico Buarque, Tom Zé, Jards Macalé ou Adriana Calcanhotto), que inclui
duetos de relativa fatuidade (precisamente Chico e Tom, nos singulares temas de
que são autores), um soberbo naipe de instrumentistas (Daniel Jobim, Domenico
Lancellotti, Marcelo Jeneci, Tutty Moreno ou Jaime Alem), compositores à medida
de qualquer arranjo (Jacques Morelembaum ou Arthur Verocai), produtores
medalhados (Kassin e Alê Siqueira) e que nem dispensa a cartada novela-das-oito
com ‘Paixão Passione’, uma coisa meio bethânia saída da pena de Ivan Lins. Ou
seja, tudo como se a indústria fonográfica de antanho não tivesse já com os
dois pés na cova, quando é óbvio que só os bolsos combinados de mecenas
privados e instituições públicas proporcionam o financiamento de uma ação de
tais características. Está aqui implícito mérito, pois, com a retração do
negócio e consequente perda de influência das editoras, se afiança que o estatuto
marginal não é uma inevitabilidade (logo em 2011, quando a melhor música feita
no Brasil – por Gui Amabis, Caçapa, Passo Torto, Pélico, Cícero ou pelo trio de
Kiko Dinucci, Juçara Marçal e Thiago França – esteve tão longe do centro das
atenções). Mas Thaís Gulin não imagina tanto a restauração de um empório
comercial quanto a possibilidade do Rio de Janeiro se tornar, novamente, uma
cidade maravilhosa – daí o onirismo do seu samba, o ambiente mavioso em que
mergulha as canções, o seu tom sonial. E essa distância da realidade chega para
obliterar um presente que não serve a quase ninguém.
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