27 de julho de 2019

Mark Dresser Seven “Ain’t Nothing But a Cyber Coup & You” (Clean Feed, 2019)

No alinhamento de “Sedimental You”, o tomo inaugural destes Mark Dresser Seven (e o pronome demonstrativo não está inteiramente correto, pois de então para cá o violinista David Morales Boroff foi substituído por Keir GoGwilt), dava-se por uma contradança algo desengonçada chamada ‘TrumpinPutinStoopin’. Era o 18 de novembro de 2016 e o mundo encontrava-se em alerta laranja em virtude da vitória de Donald Trump na recentíssima eleição presidencial. Um mês mais tarde, de forma menos subtil (afinal, contradança tem como sinónimo a palavra quadrilha), a indignação chegava às páginas da “Rolling Stone”, que exigia uma investigação à alegada interferência russa nas eleições “quer se revele ou não que Putin esteve por trás de um golpe de estado cibernético para empossar Trump” – será nesse contexto que se entende o que Dresser quererá dizer com este “Ain’t Nothing But A Cyber Coup & You”. Aliás, em notas de apresentação, o contrabaixista e compositor acusa a influência de uma figura como Charles Mingus, cujo exemplo o leva agora a “lidar com o distópico estado das coisas a partir de uma posição de esperança”. 

Escuta-se o disco e, de facto, há momentos que logo trazem à memória o Mingus de ‘Better Git It In Your Soul’, um expoente da insubordinação que o jazz viu promulgada em septeto pelo menos desde os Hot Seven, de Armstrong. Trata-se de um aspecto formal de monta: a abrir o CD, a evocação de Arthur Blythe em ‘Black Arthur’s Bounce’ lembra “Lenox Avenue Breakdown”, a mais emblemática das gravações desse prodigioso saxofonista, também ela em septeto; e, no fundo, a música de que Dresser aqui mais se aproxima é aquela que Henry Threadgill compôs há três anos para o Ensemble Double Up e há trinta para um outro septeto que sobreviveu ao conformismo dessa era. Dresser, GoGwilt, Marty Ehrlich, Nicole Mitchell, Michael Dessen, Joshua White e Jim Black a transcender a hierarquização de preconceitos que fulmina não só o seu país como amiúde a própria música do seu país, na mais assimétrica e aborígene discriminação de timbres em septetos americanos desde o “Choro Nº 7”, de Villa-Lobos. Trump caracterizá-la-ia como #FakeJazz.

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