11 de dezembro de 2020

Hallelujah Chicken Run Band "Take One" (Analog Africa, re. 2020)

Há 40 anos, cantava-se: “Natty Dread it in-a Zimbabwe/ Set it up in Zimbabwe/ Mash it up-a in-a Zimbabwe/ Africans a-liberate Zimbabwe/ Mash it up in-a Zimbabwe/ Natty trash it in-a Zimbabwe/ I'n'I a-liberate Zimbabwe”. Isto (quer dizer, a canção ‘Zimbabwe’ propriamente dita), na voz de Bob Marley, porque de zimbabuanos como Four Brothers, Black Spirits, Devera Ngwena Jazz Band, Mawonera Superstars ou Thomas Mapfumo pouco se sabia. Bem, do último imaginava-se que estivesse ocupado a arrancar a mordaça que o regime de Ian Smith lhe impunha – quando lançou “Hokoyo!” (1978), com a Acid Band, foi conduzido ao calaboiço como um perigosíssimo insurgente. Pois, em abril de 1980, nas celebrações oficiais da independência do país, no estádio Rufaro, ninguém o haveria de calar – ninguém, exceto Marley, claro, que fretou um Boeing 707 com dinheiro do próprio bolso e transportou os Wailers, 12 técnicos, 21 toneladas de equipamento e um sistema de som de 35.000 watts para poder entrar na festa. Duvida-se que tenha prestado atenção à atuação de Mapfumo – que transferia para as competências de um conjunto de música moderna o distinto padrão harmónico da música para mbira, digno de um carrossel –, mas naquele mar de gente com o rosto de Mugabe estampado em t-shirts ninguém se parecia importar muito: era o futuro que interessava. O ponto em que a cidade de Salisbury seria rebatizada como Harare, em que o estádio em que estavam viria, de facto, a chamar-se Rufaro e em que só voltariam a ouvir falar em Rodésia ao assistir à segunda temporada de “The Crown”. Infelizmente, para trás ficava também aquele tempo em que Mapfumo militou na extraordinária Hallelujah Chicken Run Band, ao lado de gente como Abdull Moosa, Elijah Josam, Joshua Dube, Wilson Jubane, Robert Nekati, Patrick Kabanda, Robson Boora ou Daram Kalanga, e em que procedia, já, à eletrificação do repertório tradicional dos xona. É o instantâneo que “Take One” capta, em 14 canções que do vinil vieram e ao vinil tornam, mais de 40 anos depois. Seria apropriado que se intitulasse take two (a antologia teve uma primeira edição em CD em 2006, com 18 temas), mas a verdade é que é importante o suficiente para recorrer aos takes que for preciso.

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