São vozes que choram, clamam, se esganam e só depois cantam. E duas mulheres que cultivam uma ambígua identidade sexual. Por isso terá o seu quê de calculismo produzir o encontro de Buika com repertório associado a Chavela Vargas. E a primeira coisa que se confirma é a grandeza de um registo tão à vontade na tradição imortalizada por La Niña de los Peines quanto noutro qualquer. Porque se nas gargantas erradas o flamenco é pouco mais que uma doença de vogais, na de Buika é tão natural quanto o primeiro grito. E servirá para revolver as entranhas destas rancheras, ora vexadas valsas, ora pútridas polcas, ora brumosos boleros, até que as canções de Álvaro Carrillo (‘El Andariego’), Agustín Lara (‘Se Me Hizo Fácil’), Juan Zaizar (‘Cruz de Olvido’) ou, inevitavelmente, José Alfredo Jiménez (de ‘Las Ciudades’, com aquele murmurado “Te vi llegar y senti la presencia de un ser desconocido”, à embriagada ‘En El Último Trago’) mais não fiquem que um cancioneiro de sussurros. Chucho Valdés – a cumprir funções próximas das de seu pai, Bebo, no “Lágrimas Negras” de Diego Cigala – evita a caída no dramatismo drag de Lola Beltrán ou Lucha Villa e lança-se por uma lírica ponte suspensa entre Bill Evans e Frank Emilio Flynn.
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