Não será fácil encontrar tão perfeito exemplo de um objecto cultural compreendido apenas no acto da subtracção quanto este álbum de estreia dos WITCH (acrónimo para “We Intend To Cause Havoc”). É evidente que numa aproximação aos Slade tenta manifestar total cedência aos mais libertários impulsos mas que lhe falta real insolência; e de nada adianta inspirar-se na incendiária crueza dos MC5 se carece de retórica revolucionária; nem o gosto por devaneios hedonistas na órbita dos Faces servirá de muito quando não se opera na gestão do próprio mito. Porque, de facto, o mundo em 1973 não precisava da repetição do processo vulcânico de Jimi Hendrix sem uma exuberante erupção pirotécnica, da aplicação da misantropia dos Black Sabbath a uma cultura de carência em vez de abundância, dos Rolling Stones sem o propulsivo priapismo ou da evocação dos Cream sem idêntica combinação de fármacos. Por tudo isso parecerá absurdo afirmar que, no período, não se vislumbra mais comovente – ainda que anémica – representação dos fundamentos do rock psicadélico do que esta. E, no entanto, é precisamente isso que proclama a oportuna reedição da banda que, a par de Ngozi Family, Peace, Amanaz ou Musi-O-Tunya, definiu o panorama artístico subterrâneo da Zâmbia na primeira metade da década de 70. E parece um milagre – pressentindo-os a rasgar o ar para se fazerem ouvir – que até hoje tenham chegado estes sons então abafados pela pobreza (com a queda do preço do cobre), pela guerra (através do apoio estatal às acções de FRELIMO, UNITA, ZAPU ou ANC em países vizinhos) e pela tirania (Kenneth Kaunda havia instaurado um ano antes o unipartidarismo), mesmo que seja só para roubar os poucos raios de sol ao mais sombrio dos invernos e lembrar que muita da história da música africana se escreveu enquanto se planeava a fuga do continente.
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