Numa edição de 1992 da Whole Earth Review, Brian Eno escrevia que a música nigeriana “minimizava harmonia e melodia em prol de combinações rítmicas extremamente ricas e complexas”, o que a tornava “extraordinariamente física, sexual e focada no movimento”, ao contrário, por exemplo, da música clássica europeia, que raramente se concentrou artisticamente no corpo (ipse dixit). O artigo, recheado daquelas intenções de que está o inferno cheio, deixou há muito de fazer sentido mas serve ainda para ilustrar o ponto de que a recepção crítica ocidental à produção africana só recentemente deixou de depender em exclusivo da experiência da alteridade. Para tal, ao longo da última década, contribuíram uma série de edições e a progressiva tomada de consciência de que o contacto com Fela Kuti ou King Sunny Adé marcava apenas a entrada na secretaria de um colossal edifício de música popular, no qual, para referir títulos recentes, tão depressa se tropeçou em material digno de figurar em futuras erratas de enciclopédias de rock psicadélico (“The World Ends”) como se escorregou em oleosos nacos de disco sound com mais gordura para queimar que os seus congéneres e putativos protótipos norte-americanos (“Lagos Disco Inferno”). Oportunamente, “Sweet Times” prova que, apesar de tanta investigação, o material inédito (só ‘Ire’, de Don Isaac Ezekiel, em “Afro Baby”, havia sido previamente antologiado) pode ainda igualar o já publicado. Confirmam-no Admiral Dele Abiodun, que em ‘It's Time for Juju Music’ revela uma visão cósmica do highlife, Tunde Mabadu, cujo ‘Viva Disco’ sugere a investida no juju que os irmãos Mizell deveriam ter feito, ou Eji Oyewole, capaz de, com ‘Unity in Africa’, insinuar que Eno, lá está, pode ter levado os Talking Heads de ‘Fela’s Riff’ a bater à porta errada.
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