Embora
cientificamente pouco rigorosa, é a essência da ‘remistura’. E na primeira divisão
da música popular abundam exemplos de obcecados pela última palavra que acorrem
a estúdios de som para acrescentar novas pistas às antigas. Por perfeccionismo,
funcionalismo, revisionismo ou, até, para corrigir imoderadas reconfigurações
aplicadas ao longo do tempo – surgem neste particular um manancial de casos com
origem no subsequente emprego do estéreo em gravações em mono. Mas no que diz
respeito a ações comandadas por editoras há um singular modelo de bom gosto
quando em 1979, na tecnicamente descritiva “Reconstituição com Orquestra e Coro
em 16 Canais”, a Copacabana gravou modernos arranjos, lá está, orquestrais e
corais, para acrescentar às pistas originais de voz registadas nos anos 50 por
Dolores Duran. Agora, chega à europa uma variação sobre o conceito realizada
pela cubana Egrem através de Omara Portuondo. Com ponto de partida nas sessões
de 1964 da carismática Paulina Álvarez (morta em 65 e cujo centenário de
nascimento se celebrou a 29 de Junho), cria-se o que à primeira vista parecem
ser meros ‘duetos virtuais’ (praga industrial da última vintena de anos que o karaoke e os concursos televisivos de
talentos exacerbaram mas que terá ainda como mais infame e necrófaga página a
revisão de Kenny G à ‘What a Wonderful World’ cantada por Louis Armstrong), mas
que uma segunda leitura tornada crucial pela presença em sete temas, dos doze,
de Xiomara Valdés, uma das antigas companheiras de Portuondo no Cuarteto D’Aida,
comprova tratar-se de um pungente regresso a uma Havana – dos anos que vão da sórdida
elegância da ditadura de Batista aos da sombria esperança da revolução de
Castro – em que as três vocalistas, quase meninas, se cruzavam por cafés,
teatros e estações de rádio sonhando apenas com o futuro.
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