Trata-se
de ouvir para crer. Nenhum outro impulso justifica a investida de Ian Brennan
pelo Malawi. Mas uma imprensa habituada a tratar factoides em vez de factos e a
valorizar o episódico no lugar do histórico seduz-se por declarações que só merecem
o benefício da dúvida: relata o produtor dos ruandeses Good Ones e dos
tuaregues Tinariwen que partiu porque “quase nada no ocidente se conhecia dos malawianos”;
que, comparando com a do Mali e Etiópia, “a sua actividade era invisível”; e
que, como um “especialista em world music”
lhe tinha categoricamente garantido que não encontraria aí produção de
qualidade, “encarou a missão como um desafio pessoal”. Que Brennan e o tal
experto não possuam as reedições da Sharp Wood de gravações de campo recolhidas
no Malawi entre 52 e 58 por Hugh Tracey é uma coisa; que ignorem o trabalho de
Daniel Kachamba, o da Chimvu River Jazz Band ou as antologias da Pamtondo já é
mais grave; mas é improvável que nada saibam de dois documentários sobre a cena
musical no país (“I Am Malawi”, de Geert Veuskens, e “Deep Roots Malawi”, de Kenny
Gilmore, colocados por ambos no YouTube) que registam inspiradas prestações de Qabaniso
Malewezi, Peter Mawanga, Gasper Nali ou Charles Mkanthamba. Mas, para sorte
nossa, talvez por isso mesmo tenham sido precisos a Brennan “3000 km ao longo
de duas semanas para vislumbrar um instrumento”. Encontrada à beira da estrada,
esta trupe de vendedores de espetadas de rato-do-campo (daí o nome), com guitarras
feitas de ferro-velho em riste, cantou-lhe em harmonia hinos devocionais (com
possível origem presbiteriana mas entoados com étnico empenho responsorial chewa) que se ouvem como uma variante de
baixa fidelidade daquele primeiro gospel
patenteado por Five Blind Boys of Mississippi, Swan Silvertones ou Dixie
Hummingbirds. E esta parte não é exagero.
"I Am Malawi" (Part 1)
"I Am Malawi" (Part 2)
"I Am Malawi" (Part 2)
"Deep Roots Malawi"
Sem comentários:
Enviar um comentário