São as
primeiras palavras que se ouvem no disco: “Fique atento, irmão!/ Fique atento
quando uma pessoa lhe oferece um caminho mais curto”. E, apocrifamente, nelas
se lê um recado para aqueles que, nunca tendo considerado o género, encontraram
em “Nó na Orelha” um atalho para a fruição do rap. Porque não só o tipo de aclamação mediática que, ao longo de
2011, gerou este segundo álbum de Criolo costuma produzir efeitos contrários
aos esperados, como se baseia, frequentemente, em considerações ilegítimas. E não
andará longe da verdade quem identifique no consenso que uma enxurrada de prémios
confirmou (Bravo, MTV, Prémio da Música Brasileira, Rolling Stone, etc) uma
premissa equívoca: a de que o impacto epocal aqui alcançado só foi possível pela
evocação de um conjunto de referências (no caso, afrobeat, bolero, música etíope ou reggae) tidas como exteriores às mais típicas configurações do hip-hop.
Ou seja, um pouco como o que em Portugal se passou há 10 anos atrás com “Beats
Vol. 1: Amor”, de Sam the Kid, o sucesso mais alargado de um MC junto da
imprensa generalista depende da aceitação tácita de uma condição
intelectualmente desonesta: a de que o hip-hop mais não é do que um (quiçá, poético)
ato de recontextualização do efémero. Criolo parece não só sabê-lo como
esperá-lo, nesta sua ação em tudo transversal que finalmente chega ao mercado
europeu. E reforça uma fragmentação de conteúdos em que o estatuto periférico é
a própria mensagem, numa perversa descontinuidade narrativa que sublinha a
dimensão social de toda a cultura, numa desarmante estilização de estratégias
de linguagem que põe preconceitos a nu ou na intensificação da música como uma
construção dos sentidos em que tudo possui uma função cognitiva e onde não há
uma palavra ou um som que não representem inteligentes recursos retóricos. Um
tratado de semiótica.
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