15 de dezembro de 2012

Criolo "Nó na Orelha" (Sterns, 2012)



São as primeiras palavras que se ouvem no disco: “Fique atento, irmão!/ Fique atento quando uma pessoa lhe oferece um caminho mais curto”. E, apocrifamente, nelas se lê um recado para aqueles que, nunca tendo considerado o género, encontraram em “Nó na Orelha” um atalho para a fruição do rap. Porque não só o tipo de aclamação mediática que, ao longo de 2011, gerou este segundo álbum de Criolo costuma produzir efeitos contrários aos esperados, como se baseia, frequentemente, em considerações ilegítimas. E não andará longe da verdade quem identifique no consenso que uma enxurrada de prémios confirmou (Bravo, MTV, Prémio da Música Brasileira, Rolling Stone, etc) uma premissa equívoca: a de que o impacto epocal aqui alcançado só foi possível pela evocação de um conjunto de referências (no caso, afrobeat, bolero, música etíope ou reggae) tidas como exteriores às mais típicas configurações do hip-hop. Ou seja, um pouco como o que em Portugal se passou há 10 anos atrás com “Beats Vol. 1: Amor”, de Sam the Kid, o sucesso mais alargado de um MC junto da imprensa generalista depende da aceitação tácita de uma condição intelectualmente desonesta: a de que o hip-hop mais não é do que um (quiçá, poético) ato de recontextualização do efémero. Criolo parece não só sabê-lo como esperá-lo, nesta sua ação em tudo transversal que finalmente chega ao mercado europeu. E reforça uma fragmentação de conteúdos em que o estatuto periférico é a própria mensagem, numa perversa descontinuidade narrativa que sublinha a dimensão social de toda a cultura, numa desarmante estilização de estratégias de linguagem que põe preconceitos a nu ou na intensificação da música como uma construção dos sentidos em que tudo possui uma função cognitiva e onde não há uma palavra ou um som que não representem inteligentes recursos retóricos. Um tratado de semiótica.

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