21 de dezembro de 2013

Eisler: Ernst Gesänge; Lieder Mit Klavier (Harmonia Mundi, 2013)



Matthias Goerne (v), Thomas Larcher (p), Ensemble Resonanz

Em 1998, no centenário de nascimento desses dois exatos contemporâneos, Matthias Goerne lançou o “Livro de Canções de Hollywood”, composto por Hanns Eisler, em Los Angeles, a partir, maioritariamente, de poemas de Bertolt Brecht. A edição, pela Decca, gerava-se no contexto da série “Música Degenerada”, uma referência à exposição organizada pelo regime nazi em 1938, sintetizada, então, num cartaz que retratava uma figura amacacada a tocar saxofone de casaca e cartola, Estrela de David desabrochada na lapela – essa caricatura, tal como Eisler, está representada na pintura de Rainer Ehrt impressa na capa acima reproduzida. A reincidência de Goerne em doze dessas composições prova que o alemão lhes investigou primeiro a técnica para agora lhes desvendar a humanidade, nomeadamente quando canta: “Confundindo cheiro e som, imagem e sentido/ O fugitivo senta-se debaixo do amieiro/ E prossegue com o seu custoso labor: a esperança”, em ‘Primavera’; “Junto à cama, na cabeceira/ Está o pequeno aparelho a seis válvulas com o seu altifalante// De manhã cedo/ Ligo o interruptor e oiço/ boletins com as vitórias dos meus inimigos”, em ‘Quarto de Hotel 1942’; “O meu filho/ Foi-me buscar para salvar um pequeno alperceiro que crescia junto à casa/ Arrancando-me a um verso em que apontava o dedo àqueles que preparavam uma guerra que/ Podia destruir o continente, esta ilha, o meu povo, a minha família e a mim próprio”, em ‘Domingo de Páscoa’. Esta “paisagem do exílio” foi musicada por Eisler, dir-se-ia, ao socorrer-se das mais irresolutas ambiguidades encontradas em Brahms, Schubert ou Wolf. Já nas “Canções Sérias” – para barítono e orquestra, derradeiro opúsculo – esse dilacerado romantismo sublinha uma dramática tomada de consciência: há sempre quem substitua os piores entre nós.

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