25 de outubro de 2014

Les Ambassadeurs du Motel de Bamako (Sterns, 2014)



Foi uma espécie de propedêutica para tempos de paz, o melhor da produção dos Ambassadeurs. Captada entre 1975 e 1977, cá está a cartilha do pão, habitação, saúde e educação, mas aqui se encontra, também, muito daquilo que ultrapassa panegíricos encargos da praxe: num momento em que se procurava identidade nacional, apresentava-se um quadro referencial marcado por multietnicidade e pluriculturalismo; quando se estimulava o orgulho pátrio, promoviam-se valores comuns a toda a África Ocidental; numa conjuntura em que se impunha a apologia política, e sob influência direta do tenente Tiékoro Bagayoko, patrono da banda e mandante no regime de Moussa Traoré, abordava-se a problemática da emigração e falava-se na obrigação de transparência no exercício de cargos públicos. A música, essa, não era menos transgressora. Isto é, o palco do bar do Motel de Bamako não era só a expressão da doutrina governamental de incentivo às artes sob o folclórico signo da ‘autenticidade’. Pelo contrário, mantendo uma disposição mandinga, estes embaixadores – Salif Keita, Manfila Kanté, Idrissa Soumaoro, Osmane Dia, “Vieux” Sissoko, Kélétigui Diabaté ou Amadou Bagayoko, malianos, guineenses e senegaleses – faziam incursões na tradição afro-cubana e na chanson, emulavam as bandas inglesas no seu processo de aculturação do r&b, invocavam o nacionalismo afro-americano e levavam a que os seus ouvintes descobrissem as múltiplas dimensões da sua própria música através da música dos outros. Este verão, reuniram-se os sobreviventes para concertos na Europa enquanto no Mali desaparecia tudo aquilo pelo que pugnaram.

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