17 de outubro de 2015

Stephen Kovacevich “The Complete Philips Recordings” (Decca, 2015)



Deu-se a conhecer como Bishop, depois passou a Bishop-Kovacevich, até que, por fim, só lhe restou o apelido croata e, no trato, pouco sobrou de uma vergonha qualquer que o parecia perseguir. Íntimos seus, referindo-se à questão, dizem coisas como: “Stephen pôde então ser quem era”. É um detalhe biográfico que amiúde se repete, embora, em rigor, não possua toda a equivalência artística que se lhe pretende imputar: ao piano, Stephen Kovacevich nunca deu mostras de ser menos que si. Cumpre hoje os 75 anos e, nas lojas, comprova-o esta integral para a Philips (gravações entre 1968 e 1983). Faz-se a convocação do insólito (um “Jazz Calendar”, de Rodney Bennett, que colocava solistas como Tony Coe ou Kenny Wheeler ao serviço de uma peça a emular o cool jazz), mas sobressaem mais velhos cavalos de batalha (o K. 467 ou o K. 488, de Mozart, algo refreados; o concerto de Grieg, invulgarmente dedutivo, com a Sinfónica da BBC e Colin Davis praticamente aborígenes; ou o de Schumann, cujo Intermezzo, de tão empático, é quase coloquial). Mediu-se ainda espaço para revelações (o sexto volume de “Mikrokosmos”, de Bartók, inédito em CD e, às suas mãos, habitado por húmidas criaturas, rastejantes e noturnas) e curiosidades várias (o seu Chopin, inesperadamente varonil; o Brahms, mergulhado em incensos, como um brâmane; ou um disco de duetos com Martha Argerich, então sua companheira doméstica). Acima de tudo, está cá Beethoven, a que deve a fama e que punha a discursar sobre o transcendentalismo numa pronúncia rigorosamente prussiana, conjugando todo o gosto da arte e todo o desgosto da vida.

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