30 de julho de 2016

Ed Motta “Perpetual Gateways” (Membran, 2016)



Um cínico diria que a crítica a “Perpetual Gateways” está escrita desde “O Retrato de Dorian Gray”, quando Oscar Wilde pôs Lorde Henry a dizer o seguinte: “Não existe tal coisa como uma influência positiva. Porque influenciar uma pessoa é conceder-lhe a nossa própria alma. Ela deixa de ter pensamentos originais ou de sentir as suas paixões. As suas virtudes deixam de ser reais. E os seus pecados – se é que tal coisa existe – vêm por empréstimo. Torna-se num eco da música de outrem.” Ed Motta tem resposta na ponta da língua. Aliás, num artigo de junho da série “Crate Diggers”, no site da Vinyl Factory, quando perguntam ao sobrinho de Tim Maia se ele compra discos à cata de influências ou, somente, com o intuito de completar a sua coleção, ele diz assim: “Isso é uma e a mesma coisa. A coleção é a personalidade. É o que me levou a querer fazer música, a aproximar-me do piano, a desejar ser como [outros músicos] e a pensar ‘vou tocar aquilo que tanto gosto de ouvir’.” Nessa perspetiva, poderá observar-se a sua discografia – principalmente a partir de “Dwitza” (2002) mas fundamentalmente em “Aystelum” (2005) e “AOR” (2013) – como uma contínua emulação.
Agora, dir-se-ia que sobe mais um patamar nesse fim de igualar ou exceder certas ações sob si exercidas por via dos discos. Porque, aqui, não se trata mais do caso do músico que, por associação, põe a descoberto figuras avunculares: Ed convoca-as mesmo ou, em alguns casos, evoca-as através dos seus legítimos herdeiros. Ouça-se, por exemplo, Patrice Rushen ao piano, Hubert Laws em flauta (lembrando o que fez com Jobim, Astrud, Airto e Deodato), Marvin “Smitty” Smith na bateria (que leva Motta ao M-Base), Greg Phillinganes nos teclados (que o conduz a Stevie Wonder, Harvey Mason ou ao Donald Fagen de “Nightfly”) ou Cecil McBee Jr. no baixo elétrico. Sim, isto é música original que se refere a si própria na terceira pessoa. Mas é também Ed Motta a mostrar o que mais gosta nos outros, que é exatamente o que mais aprecia em si.

Sem comentários:

Enviar um comentário