9 de julho de 2016

Ellery Eskelin Trio “Willisau – Live” (Hat Hut, 2016)



Há uma extensa entrevista a Ellery Eskelin na edição de junho da publicação online “Point of Departure” cujo derrame alcança “Willisau Trio – Live”. Vale a pena lê-la, até porque o saxofonista nunca deixa que a desordem domine o seu discurso. Num dado momento, vindo ao caso o alfabeto obscuro – os standards – que adquiriu na infância, recorda que cedo notou a influência da mãe, a organista Bobbie Lee: “É um fator que esteve sempre presente na minha maneira de tocar mas que a maior parte das vezes coloquei em contraste ou colisão com outros elementos”, diz. Mas já em maio de 2010, no seu blog, refletia sobre o assunto: “Eu sabia que a minha mãe tinha começado por tocar em igrejas pentecostais. Mas quando nasci já ela tinha feito a transição para a noite.” E a tomada de consciência de Eskelin era a de que, nessa passagem do mundo sagrado para o profano, a sua mãe tinha transportado consigo a premissa básica da música evangélica: a de que cada nota tem de atingir o espírito de quem a ouve. Isto é, mais do que de processo ou pose, fala-se de propósito. Talvez seja a isso que se refere quando, na conversa com o “Point of Departure”, conclui que, por vezes, “ao tocar-se uma canção, mais vale deixá-la ir sozinha”.

É de certo modo o que esta gravação de um concerto de agosto passado no festival de jazz de Willisau denota, com a autoridade dos improvisadores permanentemente posta em causa pela demencial comoção que despertam melodias como ‘My Melancholy Baby’ – ainda assim, sujeita a mais permutações do que as que Fritz Lang lhe consagrou em “Scarlet Street”, ou, em português, “Almas Perversas”, uma boa descrição para o que aqui se passa –, ‘Blue and Sentimental’ e ‘East of the Sun’. Consigo estavam Gerry Hemingway, que, na bateria, parece ter com o ritmo a relação que Escher manteve com a perspetiva, e Gary Versace, que, no monstruoso órgão Hammond B-3, tal como Carol, da adaptação cinematográfica de “O Sítio das Coisas Selvagens”, não é só fúria, frustração e rudes roncos.

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