28 de abril de 2018

Abrahamsen: String Quartets Nos. 1-4 (Winter & Winter, 2017)


Como explica com frequência Hans Abrahamsen (cf. “The Courage of Composers and the Tyranny of Taste”, de Bálint András Varga), há momentos na vida de um compositor em que se vai tão longe que se corre o risco de não se conseguir voltar atrás. No seu caso, claro, refere-se àquele período em que deixou de compor (entre 1988 e 1998) e em que passava horas, parado, a olhar para uma página em branco – imagina-se Ernest Shackleton, na Expedição Antártica Britânica de 1907-09, fitando um glaciar a perder de vista até, por fim, se decidir a salvar o pouco que podia e tornar à base sem chegar a atingir o polo sul. Esta ideia de inversão é cara ao dinamarquês. Basta pensar na sua prodigiosa “Winternacht”, em que a obra percorre as quatro estações do ano na ordem seguinte: inverno, depois outono, verão e primavera. A aproveitar a deixa, também o programa desta integral dos seus quartetos de corda parte do mais recente (2012) rumo ao mais antigo (1973) sem transmitir a ideia que se trata de um movimento regressivo. 

Pelo contrário, da mesma forma que, por vezes, no que possui de mais espontâneo e expansivo, a música de Abrahamsen dá mostras de resultar da interpretação da mente pelo mundo quando o oposto será correto, aqui, pôr os ponteiros do relógio a andar para trás é uma maneira de chegar mais depressa ao presente. Por exemplo, será impossível escutar o “Quarteto de Cordas Nº 1” sem pensar em “Schnee” (2008), com aquele mesmo som rarefeito, feito de harmónicos, como quando se passa a ponta de um dedo pela borda de um copo de cristal. O mesmo se dirá do “Quarteto de Cordas Nº 4”, embora este provenha de um ponto com pressão atmosférica tão baixa que nem tom tem, ainda que o insinue – como à noite, no campo, quando o chiar das dobradiças enferrujadas de dois portões isolados a tremer ao vento aparenta simular um diálogo. Recorrente em Abrahamsen, é uma ideia simples e radical: que não há som suficientemente remoto que não faça parte da nossa consciência – a História é o agora.

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