25 de agosto de 2018

Chopin: Late Works (Warner, 2018)

Não sendo novel, o argumento é convincente: dá-se por uma certa maturação formal nos derradeiros opúsculos de Chopin, por inovadoras conceções harmónicas, por um sentido polifónico mais apurado. Mas, como sempre, claro, a dificuldade é conciliar o que se pode fazer com aquilo que se deseja fazer. Kenner, comparando com revelações recentes, como Yundi ou Anna Gourari, ainda assim distantes do elísio onde repousam Rubinstein ou Arrau, possui, aqui, um tom menos ambarado, o que lhe permite reagir num instante à vertigem de estados de espírito da “Sonata Nº 3 em Si menor”, por exemplo, sem ter de abdicar da perspetiva algo misericordiosa que normalmente se tem da melodia no terceiro andamento. Pois, independentemente de leituras mais ou menos tridimensionais, quando, no caso de Chopin, se lê “Late Works”, o que vem à ideia é que, na altura, entre 1844 e 1849, digamos, o compositor não podia estar menos preocupado com o futuro, provando-se uma e outra vez atraído mais pelo princípio das histórias do que pelo seu fim, preso àquele lugar da sua mente em que tristeza e destino se confundiam. 

Nem seria o período de doença e desilusão que o acompanhou até à morte a fazê-lo renunciar à subtileza, apesar da preocupação por toda e qualquer patologia se ter tornado praticamente epistolar, como é óbvio. Conforme o relato de Adam Zamoyski em “Chopin: Prince of the Romantics”, em 46 veio “Lucrezia Floriani”, a novela de George Sand que fez correr muita tinta entre os amigos do casal, da fase, antes de romperem, em que a escritora se refere a Chopin como “adorável cadaverzinho”. Depois, durante a sua última viagem a Inglaterra e à Escócia, em 48, a propósito de rumores que o ligavam romanticamente a Jane Stirling, sua mecenas, Chopin disse por carta a Albert Grzymala que estava mais próximo da cova do que do casamento – por sinal, redigiu o seu testamento antes ainda de voltar a Paris. Como tudo isto invade as “Mazurcas” do Op. 58 e 63, a “Barcarola” do Op. 60 ou o “Noturno” do Op. 62 será um mistério, mas que polui a intuição de Kenner é evidente – como um véu que cai sobre outro.

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