20 de outubro de 2018

Rodrigo Amado “A History Of Nothing” (Trost, 2018)

Por mais paradoxal que pareça, em termos cosmológicos, este “A History of Nothing” remete concetualmente para uma categoria gerada pelo autor de “A Teoria de Tudo”, Stephen Hawking, quando veio o físico britânico alvitrar que “a criação espontânea é a razão pela qual existe algo em vez de nada”. Embora eminentemente metafórica trata-se de uma classificação – como será, digamos, a da “composição em tempo real” – de que Rodrigo Amado se socorre em entrevistas para melhor explicar ao que vem: “Improvisando a partir do nada podemo-nos focar a 100% no momento”, declarou ao Bandcamp Daily. Dir-se-ia um princípio fundamental da música que faz, conquanto não seja propriamente fácil de realizar. Daí, quiçá, a necessidade – a que dá resposta este grupo com Joe McPhee, Kent Kessler e Chris Corsano – de se rodear de “grandes músicos, bem melhores e mais experientes do que [ele]”, como sugeriu ao JL.

É uma frase algo enervante, pois não obstante aparentar modéstia, a verdade é que não deixa igualmente de insinuar que Rodrigo, através dessa prática, estaria, primeiro, como que a fazer audições para uma certa ideia de grandeza e, segundo, a ir sucessivamente ao encontro de músicos permeáveis à idolatria – seja como for, em virtude, até, do seu apelido, e obviamente de modo irónico, seria irresistível argumentar que havia, aí, qualquer coisa do “Transforma-se o Amador na Cousa Amada”, de Camões. Mas Rodrigo não terá razões para se preocupar. Até porque em sua defesa logo surge Herberto Helder, lembrando que “o amador (…) transforma a coisa amada” e que “o amador e a coisa amada são um único grito”. Isto, porque nunca como neste seu disco o saxofonista foi tanto aquilo que sempre deu mostras de querer ser: alguém capaz de desfiar o forro da história do jazz até a pôr do avesso e a depender de linhas invisíveis. Em “History of Nothing”, de 1962, Eduardo Paolozzi provava que a reprodução pictórica do mundo não passava sem novas imagens. Agora, neste “A History of Nothing”, confirma-se que a sua representação musical carece também de novos sons. O nada, aqui? Talvez só o tal céu noturno de que falava Emil Cioran – e contra o qual, dizia, projetamos o fogo-de-artifício da cultura.

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