10 de novembro de 2018

Debussy: Les Trois Sonates (Harmonia Mundi, 2018)

Por mais que procurasse, Debussy não se encontrava. Numa carta ao seu editor, dizia assim: “Não vou falar dos dois meses ao longo dos quais não escrevi uma única nota nem pus a mão uma só vez no piano. Nem comparado com os acontecimentos recentes isso tem qualquer importância, bem sei.” Falava da guerra. Da que o cercava e envolvia o seu país, mas igualmente da que travava consigo mesmo: “Perder tempo na minha idade [fez 52 anos em 1914] é perdê-lo para sempre!” Terá sido então que finalmente atingiu um daqueles aforismos com que o místico indiano Inayat Khan havia há coisa de meses batizado o seu encontro: “Tudo na vida nos fala, apesar do seu aparente silêncio.” Em retrospetiva, nada que varie muito daquela antiga prática ayurveda que há uns milhares de anos levava médicos a receitar histórias a pacientes com problemas emocionais e perturbações mentais.

E na verdade basta escutar “Berceuse héroïque” (1914), aqui interpretada ao piano por Tanguy de Williencourt, para logo se dar com o tempero daquele distinto modo melódico da música clássica indiana. Aliás, na antologia “Recovering the Orient” o musicólogo Roy Howat dedica-se a esse instante em que Debussy e Khan se cruzaram e a ideia que semeia é a de que Debussy se terá reunido com o seu corpo subtil. Também na “Sonata para Flauta, Violeta e Harpa” (1915), a espaços, se sente o sopro do Ganges, e Magali Mosnier, Antoine Tamestit e Xavier de Maistre tocam-na agora como se de renovação espiritual efetivamente se tratasse. Ninguém poderá dizer o contrário: “A soma de emoções que uma harmonia bem delineada proporciona não se compara à de nenhuma outra arte! Perdoa-me! Parece que acabei de descobrir a música, mas no fundo o meu caso é esse”, explicou na altura a Désiré-Émile Inghelbrecht. Do mesmo ano, comprovam-no as sonatas para violino e piano (Faust e Melnikov) e violoncelo e piano (Queyras e Javier Perianes) com que levou a sua obra a passar uma última vez da fase de crisálida à de borboleta. Faleceu há 100 anos.

Sem comentários:

Enviar um comentário