Canta Amina Alaoui e liquefazem-se azulejos em Alfama; enquanto isso, explorando o bairro sob lua incerta, o violino de Kheireddine M’Kachiche derrama tinta em mapas invisíveis e entontece-lhe nas vielas o sangue; sobretudo, as notas que se soltam do alaúde tunisino de Sofiane Negra – como grãos libertos das ampulhetas em que se guardou o pó dos califados – estremecem-lhe muralhas. É assim “Gharnati”, e tanto melhor. Pois quem reclama hoje a herança do Al-Andalus declarará – entre outras coisas – um património poético fundamental para a renovação responsável do fado. Por cá já se provou vezes sem conta que a missão não interessa a ninguém. Alaoui evoca com mais frequência tradições que vão de Granada a Tremecém ou de Córdova a Fez, mas compreendê-lo-á ao ponto de no seus concertos começar a incluir a canção de Lisboa. Ouvi-la, em “Siwan”, cantar ‘Ondas do Mar de Vigo’, de Martim Codax, funciona nessa perspectiva como uma extática antevisão. No disco – maioritariamente, poemas dos séculos XI e XII musicados por Jon Balke – esse é, aliás, dos poucos momentos livres de um absurdo musicológico que lhe tolhe movimentos (juntar versos do alentejaníssimo Al-Mu’tamid Ibn Abbad ao trompete distópico de Jon Hassell, nem aqui nem na China).
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