Terá muito que se lhe diga encontrar num título a felicidade. E embora não se defina exactamente assim o que no império mandinga produziram os griô, só uma leitura inflexível deixaria de lhes reconhecer na acção semelhanças com a tradição da Música de Câmara. E porque tem hoje de lidar com a reprodução mecânica aquele que figurava socialmente como um conservador – Ablaye Cissoko chamou-lhes “as bibliotecas de África” – multiplicam-se, da electrificação em Ba Cissoko à revisão do be bop no Kora Jazz Trio, sinais de que também os bardos africanos exploram estilos pessoais para lá da ortodoxa sujeição à narrativa histórica. Ballaké Sissoko será, aliás, e a par de Toumani Diabaté e Djeli Moussa Diawara, dos mais empenhados em renovar a música mandinga com base na kora. Desde que com Diabaté gravou, em 1999, o paradigmático “New Ancient Strings”, surgiu com Kandia Kouyaté ou Bako Dagnon, lançou o fundamental “Déli” e partiu para uma série de colaborações que foram, frequentemente, parar ao lado errado da fusão (“Le Son de Soie”, com a chinesa Liu Fang, ou “Diario Mali”, com o italiano Ludovico Einaudi, são pastiches onde não se percebe quem copia o quê). Felizmente, saíram-lhe melhor as parcerias no projecto 3MA e esta, ao lado do violoncelista Vincent Segal, onde, efectivamente, se pressente algo do espírito da música clássica. Forçando a relação, possuirão os duetos atmosferas comuns a peças para harpa e violoncelo de Villa-Lobos, Lou Harrison ou Isang Yun, embora mais depressa evoquem a Penguin Cafe Orchestra de “Signs of Life”. Mas interessará antes confirmar como falam a uma só voz, adaptando-se a diferentes escalas modais, vagueando pelo globo, desenhando arabescos, emaranhando-se nas 21 cordas da kora as quatro do violoncelo, estalando notas como elásticos até, por fim, nada mais subsistir que o seu próprio movimento, para lá da memória, no ponto preciso em que o novo se inicia. E aí, ficam desarmantes.
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