Em 1967, Bengt Berger (futuro percussionista de Don Cherry e autor, em 1981, de “Bitter Funeral Beer”) partiu para a Índia. A família do seu professor de tablas levou-o a um concerto do santo Swamy Haridhos, que Berger gravou. São mil pessoas, harmónio, violino e percussão a cantar bhajans (canções devocionais baseadas em ragas clássicas). E ouvi-las hoje é como mergulhar no mais purificador dos rios.
Ao terceiro volume, a Soundway pega na música para discutir política. Reluzente, evoca swing, son cubano, calypso, mento ou cumbia, mas logo o funk consciencializado dos combos nacionales (Mozambiques, Silvertones, etc) distorce bolas de espelho até nelas reflectir uma sociedade segregada. Seria tudo demais para a estação, não tivessem dependido também eles de incendiar pistas de dança.
Edu Lobo “Tantas Marés”
Ouvir, ao fim de 15 anos, o regresso de Edu Lobo aos originais a reboque de versões de canções compostas com Chico Buarque para “O Grande Circo Místico” e “Cambaio” é como ver a selecção brasileira a jogar sem Ronaldinho Gaúcho: implica a vitória do racionalismo naqueles de que esperávamos sensualidade. Mas só Edu Lobo para adocicar desta forma um mar de previsibilidade.
Fela Kuti, nos últimos anos, tem sido uma espécie de Bob Marley superlativo. Elegeram-no como símbolo os ainda mais politizados, os ainda mais estetizados, os ainda mais drogados. Mas a sua obra resiste à beatificação, ainda que a sua compreensão dependa de abanões como este: oblíquas partilhas do seu legado com inesperada origem na Colômbia, Trinidad ou, mais recentemente, Munique.
Decantação absoluta dos ensinamentos de Umm Kulthum (aquela a que chamavam ‘astro do oriente’, “quarta pirâmide do Egipto’, etc) dispensando o registo semi-operático das ondulantes orquestras que a acompanhavam e concentrando antes a acção num enlevo de câmara em que contrabaixo, oud e pandeireta sublinham as sombras na voz de Benali. Perfeito para dias em que o sol se revele impiedoso.
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