Coincidiu com a ascensão do jungle nas pistas de dança um efémero revivalismo do benga nos mercados discográficos. E embora, que se saiba, nunca tenha sido um associado ao outro, a verdade é que não perderia em ‘batidas por minuto’ o ousado DJ que na altura saltasse entre géneros. O que, para além da concórdia rítmica, é apenas outra forma de dizer que tudo nesta explosiva antologia é sobre velocidade e permanência: baixos cuspidos como dardos numa zarabatana, guitarras em incessante chilreio metalizado, harmonias a duas vozes disparadas em campos de tiro, baquetas metralhadas sem piedade metronómica no aro das tarolas, epilépticos pratos de choque… Por vezes, seguir-lhes a cadência é como tentar medir o pulso a uma máquina de pinball. Aliás, o esforço de concentração que estes temas exigem – estrutura em instabilidade tectónica, graves com a maleabilidade da borracha e vulcânicos agudos – implica que seja efectivamente na ‘batida’ que se fixem atenções. Até porque, no seu melhor, a experiência conduz a um estado de imersão sensorial. Talvez por isso se tenha Daniel Owino Misiani coroado enquanto ‘Rei da História’ – como se ao ouvinte devessem interessar exclusivamente os fenómenos intrínsecos à sua produção dentro do estilo de que se tornou o principal propulsor. O que não significa que não se lhe detecte elasticidade capaz de assimilar traços do soukous – nomeadamente na maneira em que colocava as secções instrumentais no fim das canções – ou, num arrítmico carrossel eléctrico que gira em torno das melodias, do kamba (Misiani, que faleceu em 2006, era, como Barack Obama, descendente dos Luo). Ainda assim, como aqui se comprova, nada contaminava a soberba de um discurso que tinha como único senão a inevitabilidade de se ver conduzido até ao limite das suas próprias possibilidades. Só que, como se diz, o que interessa é a viagem.
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