Vão-se
relativizando os rótulos e, com o passar dos anos, até a provocante
incongruência do camaronês Francis Bebey ganha sentido. Mas nem subordinando o
seu inquisitivo espírito ao apócrifo programa estético da electrónica se
estabelece um credível precedente esquemático para a sua ação. Porque, ao
contrário do que o título desta antologia sugere, não deu à costa mais um
insondável visionário agarrado a uma prancheta de módulos. Quanto muito,
correspondendo à instigação, ensaiam alguns destes temas estratégias cujo
caráter eminentemente lúdico e hedónico evoca peças de Pierre Henry, Holger
Czukay ou Terry Riley, embora nada se lhes assemelhe tanto quanto a versão de
‘Soul Makossa’ que o obscuro Rod Hunter criou num sintetizador Moog. Na
verdade, a excentricidade de Bebey aproxima-o antes das gravações
disponibilizadas por catálogos como Bruton, De Wolfe ou Tele Music para uso
comercial (parece, nessa perspetiva, apropriada a gralha que na contracapa desta
edição apresenta ‘Super Jungle’ enquanto ‘Super Jingle’). Mas o tom de paródico
futurismo das suas vinhetas ao sintetizador e teclados diversos jamais se
esgota numa leitura tão utilitária. Aliás, o descomprometido multiculturalismo,
a estranha acessibilidade, o sardónico universalismo – tão marcantes, sedutores
e imaginativos – que aqui se encontram, não diferem filosoficamente da sua extensa
produção inspirada pelas guitarras de Segovia ou Baden Powell, pela polifonia pigmeia
ou pela música para sanza (idiofone
de lamelas próximo do quissange angolano) que a retrospetiva quádrupla “La Belle Époque” (Celluloid,
2011) tão bem sumariou. Porque este romancista, poeta, ensaísta e compositor
falecido em 2001, em qualquer meio e empregando os mais inesperados recursos, mais
não fez do que relembrar que nunca se dá por terminada a criação do mundo.
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