6 de junho de 2015

Anders Jormin, Lena Willemark, Karin Nakagawa “Trees of Light” (ECM, 2015) & Sinikka Langeland “The Half-Finished Heaven” (ECM, 2015)



Terá sido o compositor Minoru Miki a sugerir a Keiko Nosaka a criação de um koto que melhor se adequasse à interpretação de música contemporânea. É o que relata a investigadora Bonnie C. Wade em “Composing Japanese Musical Modernity”, lembrando que, em 1969, por alturas do seu segundo recital a solo, Nosaka viria a surpreender a plateia através de um instrumento mais dinâmico, com outra extensão em termos de escala (possuía 21 cordas, por oposição às canónicas 13 ou 17) e maior flexibilidade no que diz respeito à afinação. Expandiu-o em 1991, para as 25 cordas, estreando peças de Takahashi ou Ifukube, pelas quais, de modo paradoxal, pareciam duplicar-se os silêncios, e é, desde esse ano, professora de Karin Nakagawa. Serve o preâmbulo para que se desenvolva, então, alguma resistência face ao fetichismo com que a ECM descreve a iniciação de “Anders e Lena nos mistérios da tradição milenar do koto”. Até porque “Trees of Light” é imune a qualquer categoria provisória e ignora o anonimato. Aliás, sabe ao que vem quem conhece o imaculado percurso da cantora sueca: ouve-se, pelo disco, o murmúrio de madeiras escuras (Willemark toca ainda rabeca e violeta), entoam-se baladas de gratidão pela generosidade de noites auríferas, sagram-se aparições nos musgos e nos halos das florestas, cruzam-se constelações de lúcidas sílabas geladas com aquelas enlouquecidas e ardentes onomatopeias redimidas ao aboio, aqui quase totalmente femininas, pontuadas pelo sangue. E enquanto dos dedos da japonesa florescem presságios, detêm-se os do contrabaixista pela caligrafia dos astros, como é seu costume desde os tempos em que tocava nos grupos de Bobo Stenson ou Charles Lloyd. Também “The Half-Finished Heaven” traz um instrumento da família da cítara modificado, no caso o finlandês kantele, de 39 cordas, e prossegue igualmente por via do paganismo crepuscular. Com Langeland estão o violetista Lars Anders Tomter, o saxofonista Trygve Seim, o percussionista Markku Ounaskari e as palavras de um poeta, Tomas Tranströmer, recentemente falecido, que se deixou um dia seduzir pelo amarelo da Carris.

Sem comentários:

Enviar um comentário