6 de junho de 2015

Szymanowski: Complete Music For Violin And Piano (Brilliant, 2015)



Pouco antes de falecer, descontente, adoentado e à beira da destituição, do teto dos Cárpatos, na estância invernal de Zakopone, Karol Szymanowski (1882-1937) escrevia que o oficialismo polaco nada queria saber de si: “Posso morrer sem que ninguém mexa uma palha. Mas já o meu funeral vai ser muito diferente. Estou convencido que vai ser esplêndido.” Tinha obviamente razão, conquanto cingisse o presumível aparato exequial a fins propagandísticos. Afinal, havia passado os derradeiros anos da sua vida a sufocar sob a redoma do amor pátrio, infetado por melancolia e bucolismo, louvando a lavoura e o lavor de uma remoçada nação. Ele, que na juventude tinha denunciado sem clemência a peculiar estirpe de patriotismo desenvolvida por predecessores seus, como Paderewski, e, de modo singular, logo a partir de 1919, questionado o posicionamento da Polónia face a distintos modelos culturais europeus. Talvez por isso, com frequência, se deslustre a evocação da sua figura através das nódoas da insegurança e da incoerência, como se todas as encruzilhadas de um período tão fértil em contradições tivessem subitamente adquirido domicílio na sua obra. Mas se alguma coisa prova a leitura de “Polish Music since Szymanowski”, de Adrian Thomas, é que o compositor teve que suportar a terrível coincidência histórica de partilhar com o seu país uma contínua crise de identidade. Nessa medida esta generosa integral das suas peças para violino e piano, por Bruno Monteiro e João Paulo Santos, é de uma fidelidade notável, identificando rigorosamente as inconfundíveis fases romântica, simbolista e nacionalista, mantendo a linearidade quando a música o exige, sucumbindo ao feitiço da cor quando ela a tanto obriga, tornando o som alegórico quando nada mais que a ingenuidade o parece temperar. E, ao mesmo tempo, deixam os intérpretes tentar-se pela transcendência, esquivando-se ao contexto, renunciando à ideologia, enlaçando a sensualidade. É nesses instantes que surge aqui um Szymanowski definitivo.

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