12 de setembro de 2015

Bill Evans “The Complete Fantasy Recordings” (Concord, 2015)



Dir-se-ia outra alma perdida para os berloques do esoterismo: em meados de 60, Bill Evans era acompanhado por orquestras (Legrand, McFarland, Ogerman), tocava música para filmes (Mancini, Ortolani, Rózsa), visitava os clássicos (Bach, Chopin, Fauré), fazia de cicerone a Monica Zetterlund (fresquinha do último lugar obtido no Festival da Eurovisão de 1963) e personificava o transtorno dissociativo de identidade (“Conversations with Myself”, “Further Conversations with Myself”). Vivia torturado por passadores de heroína, estava à mercê de agiotas (ameaçavam partir-lhe os dedos sempre que falhava pagamentos) e, por esses dias, mais facilmente se encontrava enfiado numa cabine telefónica de agenda na mão e auscultador seguro entre o ombro e a orelha (pedia diariamente dinheiro emprestado a amigos) do que em casa a tocar piano. Por tudo isso se diz que as sessões representadas nesta integral da Fantasy, gravadas entre 1973 e 1979 e agora reeditadas, se assemelham a um renascimento. Em discos como “Intuition”, “Alone (Again)” e “I Will Say Goodbye”, ou nos duetos com Tony Bennett, cá estão novamente aqueles solos de infinitas matizes (Glenn Gould apelidava-o de “Scriabin do jazz”), as construções rítmicas praticamente contraintuitivas (Marian McPartland descrevia-as como “nadar contra a corrente”), o espontâneo coloquialismo (com Eddie Gomez), o balanço entre candura e calculismo, o teclado como palco de todas as vulnerabilidades mas também como acesso ao que possui cada pianista de mais irredutível, enfim, os longos compassos agnósticos. Cumprem-se terça os 35 anos da sua morte.

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