Por
volta de 1993, quando Joshua Redman apareceu, a questão da hereditariedade
colocava-se de outra maneira, como se o jazz fosse um conjunto de obrigações que
se transmite, em vez de uma liberdade pessoal que se reclama. Ainda assim, o
saxofonista recusava-se a alimentar aquela crónica mais etiológica da coisa,
que apontava para a inevitabilidade de o filho vir a lidar não só com os
direitos mas também com os encargos artísticos deixados pelo pai – bem, nessa
perspetiva, enquanto objeto psicanalítico, seria mais provável transmutar-se
gradativamente em Édipo! Seja como for, não se vislumbra uma estreia tão
desprovida de neuroses quanto a sua – e ao segundo disco, “Wish”, a tocar ao
lado de Pat Metheny, Charlie Haden e Billy Higgins, parecia nomear-se acima de
tudo herdeiro de Ornette. Aliás, na altura, por mais que chamasse a atenção de
todos quanto o escutavam para o que aquela gente que tinha sensivelmente a mesma
idade que a sua fazia (e James Carter logo salta à memória), a verdade é que
Joshua dava mostras de pertencer a uma geração anterior, até, à do próprio pai
– como se tivesse mais que ver com quem deu os últimos retoques no jazz
enquanto bem artístico, como Don Redman, que efetivamente o precedia em enciclopédias.
Traía-o o repertório: no seu primeiro álbum, tocava ‘I Got You (I Feel Good)’,
de James Brown, bem como ‘Salt Peanuts’ (Dizzy Gillespie); em ‘Wish’, fazia uma
versão de ‘Tears in Heaven’, de Eric Clapton; em “Timeless Tales (For Changing Times)”,
incluía em alinhamento temas de Joni Mitchell, Bob Dylan, Stevie Wonder ou dos Beatles.
Era como se estivesse a acusar precocemente a passagem do tempo. Ato contínuo,
em 2001 lança “Passage of Time”. E, agora, com 50 anos acabados de fazer em
fevereiro, é aos instrumentistas desse transitório CD que regressa: aos flexibilíssimos
mas exatos Aaron Goldberg (piano), Reuben Rogers (contrabaixo) e Gregory
Hutchinson (bateria). Não se trata do seu único quarteto no ativo, claro: com
Ron Miles (cornetim), Scott Colley (contrabaixo) e Brian Blade (bateria),
editou no ano passado “Still Dreaming”, onde põe finalmente em ordem o legado
de Dewey Redman. Aqui, transferindo a espontaneidade e a versatilidade
novamente do modo de compor para o de interpretar, dir-se-ia honrar, antes,
figuras avunculares, como foi sempre Sonny Rollins e como, de repente, aparenta
ser Charles Lloyd. Cá está a mesma técnica associativa e disposição oracular, o
mesmo desejo de pôr um pé na eternidade, aconteça o que acontecer.
Sem comentários:
Enviar um comentário