12 de janeiro de 2013

Kayhan Kalhor “I Will Not Stand Alone” (World Village, 2012)



A música que Kayhan Kalhor e Ali Bahrami Fard vêm apresentar à Culturgest*, inspirada pela repressão aos protestos que se seguiram ao anúncio da vitória de Ahmadinejad nas eleições presidenciais de 2009 no Irão, é, em disco (“I Will Not Stand Alone”), tanto um elegíaco ciclo quanto um resistente clamor. E a opção dos músicos em mergulhar mais nas sombras dos graves (Kalhor estreia no álbum uma variante do kamancheh criada pelo prestigiado luthier Peter Biffin, cujo acréscimo de cordas permite uma aproximação àquela crueza reverberante e textural da viola da gamba, e Fard apresenta-se no santour baixo, de 96 cordas, percutido por plectros, espécie de Bösendorfer Imperial do universo dos címbalos) deve ser compreendida sob esse prisma. Pois, aqui, tudo emana das trevas – fé, arte e política, num mesmo cárcere. Mas Kalhor, que, no passado, em registos com o Kronos Quartet, com o projeto Silk Road, de Yo-Yo Ma, ou nas suas colaborações com o indiano Shujaat Husain Khan e com o turco Erdal Erzincan (editadas pela ECM), sempre salvaguardou princípios de tolerância com uma certa ecumenicidade, subverte as expectativas do próprio luto, acendendo uma centelha nas profundezas, transformando ardor em combustível através de fórmulas melismáticas que arrancam as entranhas às modalidades clássicas persas. Sobre o tumulto criado por Fard, que toca como se precisasse de acender 96 pavios com recurso a um único fósforo, Kalhor procede quase como um vândalo da melancolia, ornando em espirais as colunas que sustentam as ruínas do mundo, numa abundância de notas e efeitos, um desamparado hinologista numa câmara escura contando os raios de sol, articulando um pedido de misericórdia e um arrependido lamento pelo verdugo que há no Homem.

*Kayhan Kalhor & Ali Bahrami Fard
Culturgest, Lisboa 
Sex, 18 de Janeiro, 2013
Grande Auditório, 21h30

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