29 de setembro de 2018

Matthew Shipp “Symbol Systems” (re. Hat Hut, 2018)

Por querer evitar comparações com Cecil Taylor, quiçá, foi resistindo à ideia de lançar um disco a solo. Até que em junho de 1995 recebeu um convite para atuar no âmbito da Workshop Freie Musik, na Academia das Artes, em Berlim (exatamente a cidade europeia em que Taylor havia deixado mais impressões digitais – cf. “In Berlin ‘88”, a monumental caixa de 11 CD com a chancela da FMP) – e lhe terá vindo à ideia uma frase de Marx sobre o modo em que a História se repete em relações avunculares. Mais, ainda, ao perceber que o concerto seria gravado e colocado no mercado pela mesmíssima editora – quando efetivamente saiu, em 1997, como “Before the World”, lia-se em notas de apresentação suas que na altura “trabalhava em coisas [saídas] da literatura clássica” do instrumento, “principalmente barrocas”. Coisas que continuavam a fazer-lhe cócegas nos dedos quando regressou a Nova Iorque e se pôs a pensar mais seriamente no que significava, ao certo, ter um disco a solo – se não seria a oportunidade de passar para o papel, em termos figurados e, até, literais, as ideias soltas que lhe titilavam a mente. 

Resulta daí este “Symbol Systems”, de novembro de 1995 – o primeiro álbum a solo de Matthew Shipp. Comparado com os dez que desde então lhe seguiram – o último dos quais, “Zer0”, já este ano, na ESP – revela um cuidado extremo na articulação clara de cada linha melódica, na solidez de cada frase, porventura gerando estruturas menos maleáveis do que aquilo que seria de esperar num improvisador. Aliás, esta reedição permite identificar um padrão que não se parece com o de mais ninguém e se diria de tal forma integrante do seu discurso que, de facto, se prova irresistível ir visitá-lo à fonte: uma espécie de obsessão em escalpelizar impulsos saídos do nada, uma vontade de quebrar o núcleo dos átomos musicais mais instáveis e ao mesmo tempo de modelar e canalizar a energia que libertam, de levar o free para a cama. Talvez por isso, em entrevistas, Shipp fale tanto de “forças primevas”, de “desejo”, do “abismo”, do “vazio” e do “Big Bang”: na sua discografia, é aqui que ele está.

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