9 de junho de 2018

Pettersson: Symphonies Nos. 5 & 7 (BIS, 2018)

Sem apetite algum e a cair de cansaço, Allan Pettersson (1911-1980) falava da cama de um hospital aos jornalistas: “Nesta espécie de túnel em que vivo, não há ninguém. Nem Deus, nem nada que se pareça. Existo eu, inexoravelmente só. Se quiserem, há uma vontade – uma força que jorra de um condenado.” Referia-se às suas novas sinfonias – a décima e a décima-primeira, cujos contornos esboçou internado enquanto recuperava de doenças do fígado e via agudizar-se a artrite reumatóide de que há anos padecia. Como afirmou um dia a Leif Aare, o seu biógrafo: “A música que faço reflete a minha própria vida, as suas bênçãos e maldições.” Daí tanto se falar em catarse a seu respeito. Num documentário, “Sangen om livet” (ou “A Canção da Vida”), o seu irmão conta como lhe era difícil levantar-se da cama de manhã, de tantas dores, mas que assim que se sentava na secretária a compor o seu sofrimento parecia esvanecer-se. “Ainda mantenho um horário de expediente”, declarava Pettersson. “Graças à minha imaginação e à minha capacidade de abstração, chego a esquecer-me deste absoluto inferno em que vivo. Mas claro que, quando acabo de trabalhar, cá estou eu, novamente velho e doente. E aí vou-me completamente abaixo.” 

Em 1968, quando a sua sétima sinfonia se estreou, não se podia imaginar um compositor mais desligado do seu tempo, mas a verdade é que Pettersson não estava assim tão distante do Stockhausen de “Aus den sieben Tagen”, em que o alemão sugeria coisas como “Toca uma vibração no ritmo do teu próprio corpo”. Claro que a sua música não se escutava em Darmstadt – aliás, nem aí, nem em praticamente lugar algum. E 50 anos depois não se pode dizer que o caso tenha mudado de figura. Daí a importância deste ciclo de gravações com a integral da sua extraordinária obra sinfónica, uma daquelas raras vias de acesso à música contemporânea que as patrulhas de vanguarda não sentiam necessidade de rigorosamente vigiar. Talvez encontrassem aqui mais dor que a que seriam capazes de suportar ou talvez este lugar fosse solitário demais – porque esta quinta e esta sétima são de partir o coração.

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