23 de fevereiro de 2013

Baden Powell “À Vontade” (Soul Jazz, 2012)



Os nomes próprios, por inspiração paterna, vinham do apelido composto do fundador do escutismo, Lord Baden-Powell, e é indesmentível que o guitarrista brasileiro aparentava levar uma vida de prospetivo nomadismo. Já o sobrenome, efetivamente familiar, remetia para Tomás de Aquino, o qual terá porventura lido sob o prisma da dialética aristotélica que o teólogo dominicano integrou no cristianismo. Mas a verdade é que Baden Powell de Aquino era mais virtuoso e errante nos palcos do que longe deles, apesar de europeiamente domiciliado no final da década de 60 em Paris e, quem sabe se num acaso chistoso, em Baden-Baden. Aí, tendo encontrado a luz na floresta negra através de uma série de títulos para a germânica MPS, confirmou-se um distinto hilemorfista, esculpindo materiais folclóricos com um decoro absolutamente ético, ainda que os estivesse a inventar à medida que lhes conferia forma. Porque, noutra das contradições a que entregou a ação, Powell operava na esfera do mito sobretudo quando a sua audiência acreditava estar perante a personificação do sincretismo popular sul-americano. A reedição de “À Vontade”, o seu quarto álbum, gravado em 1963, evoca a génese de tão singulares características e relembra o instante, algo contingencial, em que abandonou em definitivo o que se preparava para ser uma carreira largamente subterrânea. Ao estrear quatro dos 25 afro-sambas escritos em apenas três meses com Vinicius de Moraes (‘Consolação’, ‘O Astronauta’, ‘Candomblé’ e ‘Berimbau’), é igualmente o momento em que se ditou um destino que, não obstante a generosidade, a complexidade e a originalidade das suas criações, jamais se afastaria dessa fantasiosa visão do primitivismo afro-baiano. Espartano, esquivo e elegante, Baden Powell tocava como se tivesse pudor em largar beleza no mundo. Foi essa a sua maior dádiva.

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