Com a
vulnerável impetuosidade da juventude, Zhang Shengliang – o púbere chinês, de 15
anos, internacionalmente conhecido por Niu Niu – propõe um programa que
ressalva o generoso proselitismo de Franz Liszt (1811-1886), sublinhando-lhe
simultaneamente as mais quiméricas capacidades, num conjunto de transcrições de
Saint-Saëns, Paganini, Schubert e Wagner. Naturalmente, o prodigioso pianista
deleita-se na travessa e dilatada secção central da “Danse Macabre” – que
estimula com invulgar acerbidade – e prova-se apropriadamente temperamental num
trio de temas extraídos aos “Grandes Études de Paganini”, cuja lendária
transcendência domestica com sutileza e sobriedade, mas, em “Das Wandern” ou em
“Isoldes Liebestod”, perde alguma fluidez quando, em peças do austríaco e do
alemão, o essencial da ação se transfere do tempo cronológico para o psicológico.
É, de certa forma, um problema de perspetiva de que está isento o italiano
Michele Campanella ao concentrar, neste ano de bicentenários, o integral das
incursões do compositor húngaro na obra – predominantemente operática – de Verdi
(1813-1901) e Wagner (1813-1883), reforçando-lhes um aspeto de manifesta
modernidade: a imposição da paráfrase como um instrumento ao serviço do mais
escrupuloso multiculturalismo. De facto, Liszt operou aqui no coração de um
dogma – o da construção identitária – que conduziu aos limites da invenção e da
ética, intervenção que mais vital e definitiva se tem revelado com o passar dos
anos.
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