4 de maio de 2013

Ches Smith and These Arches “Hammered” (Clean Feed, 2013)




Ches Smith apresenta um ambicioso estudo informado por trabalho de campo – ao lado de necrófilos da estirpe de Trevor Dunn (na presente encarnação do Trio-Convulsant), Jamie Stewart (nos neogóticos Xiu Xiu), Carla Bozulich (na encantação acusmática de Evangelista) e Trey Spruance (na funérea excentricidade dos Secret Chiefs 3) – desenvolvido nas mais variadas morgues musicais, autopsiando cada compasso e tónica, escalpelizando estrofe e refrão ou dissecando timbre, harmonia, melodia e ritmo com a incansável diligência de um patologista do apocalipse e o mórbido zelo de um enciclopedista de profecias. Numa análise geracional, o que há uns anos passava por iconoclasta curiosidade (no testemunho de figuras como John Zorn, Weasel Walter ou Elliott Sharp) deu hoje lugar a uma espécie de neurótica insaciedade (em Ches e em nomes como Kris Davis, Nate Wooley ou Peter Evans), que tem como crucial mais-valia algo de extremamente simples: a expressão de artistas que são mais do que uma lista de restrições dentro de determinada categoria, iludindo quer a tradição quer a redutora neofilia, e cujo discurso se fundamenta na assunção de um ilimitado terreno de exploração. É nessa perspetiva sintomático que se anuncie já que o próximo tomo destes These Arches – Smith na bateria, Tim Berne no saxofone alto, Tony Malaby no saxofone tenor, Mary Holvorson à guitarra elétrica e Andrea Parkins ao acordeão – seja um disco com versões de temas associados a Nina Simone, precisamente gravado com o vocalista dos Xiu Xiu. E não admira que “Hammered” se revele este concentrado de estilos – jazz alienante, desfocado folclore, vísceras de rock – com subversivos fogachos de coesão e enigmáticos hinos, ocasionalmente desconfortável e rudemente abstrato, mas nunca menos do que uma fascinante assembleia de improvisadores fora de série.

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