Como tantas vilas na costa
ocidental africana, Thiès desenvolveu-se de acordo com imperativos coloniais,
devendo-se o ímpeto fulcral para o seu crescimento à construção de um entroncamento
ferroviário que agilizou a comunicação entre Dakar e o resto do país, e, ao fim
de décadas de empreitada, concretizou a junção com a linha vinda de Bamako, no
Mali. O surto de atividade comercial deu origem a uma fixação de populações
migrantes – de diversas etnias e nacionalidades – e ao correspondente aumento do
tecido urbano, com os seus bairros residenciais, pequenos negócios, praças e
mercados, bares e restaurantes. É o tipo de cidade na região que, desde a
independência, se desfaz em nostalgia e se revela perversamente indiferente ao
progresso. Em agosto de 2004, o grego Adamantios Kafetzis, colecionador de
discos, brindava a glórias passadas num bar local, transportado por uma banda para
um tempo sem retorno. Descobriu que o distinto barítono que o enfeitiçava em palco
era o de Adama Secka, cantando ao lado da vetusta Royal Band de Thiès. A
continuação da história é familiar: Secka conduziu-o a James Gadiaga, antigo
vocalista do grupo, ex-Super Diamono e atual Super Cayor, que por sua vez lhe
entregou uma preciosa fita, na sua posse há 25 anos – imaculadas gravações de
1979 realizadas por Moussa Diallo, o mesmo que registou álbuns de Youssou
N’Dour com a Étoile de Dakar, de Pape Seck com a Number One ou o mítico
“Pirates Choice”, da Orchestra Baobab. O que aí ouviu – e que agora edita neste
“Kadior Demb” – é o mesmérico som dessa gente em trânsito, vaporizando formas
cubanas, embriagando ritmos tribais, vivendo o sonho a cada nota na guitarra
elétrica e a cada baforada no saxofone, algo tão essencial e vibrante quanto a
própria vida e tão belo e inesquecível quanto esses símbolos da modernidade
senegalesa, até hoje perdido na noite.
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