Gyula Csík, Bora Dugic, Tcha Limberger, Nedyalko
Nedyalkov,
Dimitri Psonis, Moslem Rahal, Hespèrion XXI, Jordi Savall (d)
Dimitri Psonis, Moslem Rahal, Hespèrion XXI, Jordi Savall (d)
Uma romaria de jangadas engalanadas
com flâmulas e grinaldas de flores escolta um ícone rio abaixo; uma procissão
agita incensórios nas margens e mistura-se a neblina com a fumaça das fogueiras;
chamejam detritos de madeira pela cintilante superfície das águas tépidas e quase
naufraga a escotilha com a ruidosa desordem de músicas e danças que empesta o
ar, até que de um lanho na terra desponta o clamor de um coro para o fim dos
dias. Trata-se de uma cena de “O Tempo dos Ciganos”, o filme de Emir Kusturica
que, há 25 anos, renovou nas plateias internacionais o fascínio pelo
‘folclorismo mágico’ das Balcãs. A canção que a ilustrava era desobrigada de
qualquer filiação cultural específica através da salganhada orquestral de Goran
Bregovic, numa estratégia – extensível às insanas fanfarras de “Underground” – que
lhe garantiu lugar cativo nos festivais de ‘música do mundo’ no preciso momento
em que a Jugoslávia se desintegrava. Conforme escreve Pedrag Matvejevic no
livreto desta edição: “Nas Balcãs, nem sempre se permitiu que o passado se
convertesse em História”. Isto é, domina uma agenda tendenciosamente esotérica e
paradoxal em que se sobrepõe o mito à realidade. Por isso, sabe o autor de
“Breviário Mediterrânico” que, por aí, “o património que tentamos salvar contém
em si parte daquele património de que precisamos que nos salvem”. Jordi Savall
refere-se ao mesmo orgiástico fratricídio que desfigurou traços comuns em
muitos – sérvios, romenos, turcos, gregos, curdos – dos que ganham
representação neste álbum. Mas onde alguns veem o “barril de pólvora da Europa”,
encontra o catalão o seu berço, num mosaico multicultural unido exatamente por
aquilo que inflama a retórica nacionalista: identidade e paixão.
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