13 de julho de 2013

Scodanibbio: Reinventions (ECM, 2013)





Quartetto Prometeo

“Reinvenções”, chamou Stefano Scodanibbio (1956-2012) ao conjunto das obras reunidas neste CD, pungentes derivações para quarteto de cordas a partir de “A Arte da Fuga” (Bach), de peças para guitarra de compositores espanhóis (Sor, Llobet, Aguado, Tárrega) e de populares canções mexicanas. Mas, com outro húbris, podia tê-las batizado como revisitações, recomposições ou, talvez, tão perversa quão apropriadamente, enquanto decomposições. Pois esta é tanto uma metamúsica quanto uma anamúsica, com delicadas estruturas constituída por prismáticos harmónicos, figuras espelhadas e invertidas ou vítreas e etéreas gradações – resultantes de indicações de arcadas sul tasto e sul ponticello – que se deixam afetar por uma letárgica recorrência a tempos lentos que, no limite, implicam um fascinante paradoxo: estas páginas que já nasceram escritas nunca chegam verdadeiramente a ganhar forma reconhecida. Por isso, a espaços, e com maior evidência canónica nos ‘Contrapunctus’, sugerem um estágio de putrefação que difere da noção de poslúdio desenvolvida por Valentin Silvestrov, por exemplo, e que se aproxima antes de procedimentos recentes de James Kirby e William Basinski, possuindo, ainda, afinidades espirituais com o Michael Nyman de “Decay Music” ou o Gavin Bryars de “The Sinking of the Titanic”. No fundo, Scodanibbio atua como o estilista que tem de desenhar roupa específica para casos avançados de fibromialgia ou osteoporose: mantém um dispositivo formal mas torna-o mais ágil, flexível e aberto, urde uma trama densa mas só usa materiais leves, isto é, cria uma espécie de segunda pele que não chega a estar propriamente em contacto com a primeira. Há exceções – nas vigorosas e arrebatadas ‘La Llorona’ ou ‘La Sandunga’ – e uma pérola: uma ‘Bésame Mucho’ (Consuelito Velásquez) quase tão frágil e bela quanto a que João Gilberto gravou em “Amoroso”.

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