21 de setembro de 2013

Cannonball Adderley with Milt Jackson “Things Are Getting Better”; Chet Baker “Plays the Best of Lerner & Loewe”; Bill Evans Trio “How My Heart Sings!”; Wes Montgomery “So Much Guitar!” (Riverside, 2013)



 
 
 

Quando criada, em 1953, a Riverside era como um areal ancinhado por Bill Grauer e Orrin Keepnews, zelosos respigadores em busca de detritos deixados nas enxurradas do ragtime, boogie-woogie e swing – atestam-no as primeiras referências na etiqueta, dedicadas a Jelly Roll Morton, Albert Ammons ou Duke Ellington. Só que esses apóstolos de uma religião cedo se converteram em neófitos noutra. Assinando Thelonious Monk, Randy Weston, Sonny Rollins, Johnny Griffin ou Abbey Lincoln, e na senda das concorrentes Prestige, Contemporary ou Blue Note, a editora, em nome próprio e através da subsidiária Jazzland, e conquanto não fosse essa a disposição inicial dos seus fundadores, veio a revelar-se uma diligente prospetora de jazz moderno. Sessenta anos depois, a partir de jurisdições menos restritivas em termos patrimoniais, é óbvio que estas gravações – por negligência do proprietariado e por, em suficientes países, terem entrado em domínio público – passaram já pelas mais variadas mãos. Nesse âmbito, tem-se hoje como certo o que anteriormente se subestimava: que nenhuma tiragem dura para sempre; que colecionadores no mundo inteiro, ainda que integral ou avulsamente as possuindo, favorecem a excelência técnica e a inserção de inéditos nas suas reposições; e que apenas a sua manutenção em catálogo pelos detentores das matrizes tem um efeito regulador nos mercados. Bem o sabe a Concord, atual publicadora da Riverside, que relança estes discos com remasterizações, novos textos nos livretos e estreias resgatadas às bobines – de modo perverso, num ano de simbólico aniversário, e com um punhado de títulos de batismo tão otimista, lembra sessões organizadas em torno de líderes que nem em França teriam atingido a idade mínima da reforma.

“Things Are Getting Better”, de 1958, junta Adderley ao vibrafonista do Modern Jazz Quartet e, sem desprimor para Billy Mitchell, confirma a falta que o saxofonista fez no encontro entre Jackson e Ray Charles, nesse ano dado à estampa. A reunião foi estelar mas desafetada, colorida por Art Blakey, Percy Heath e Wynton Kelly. Mais tensa, a adesão de Chet Baker ao repertório do libretista Alan Jay Lerner e do compositor Frederick Loewe, de 1959, não foi por isso menos evasiva: aliás, talvez as evocações das Terras Altas de “Brigadoon”, da Paris de “Gigi” ou da Londres de “My Fair Lady” tenham estado na origem do exílio europeu do trompetista, acabado de sair da prisão de Rikers. Mas tal como em “Chet”, com o essencial do grupo que aqui o acompanhava (Bill Evans, Herbie Mann, Pepper Adams), só fazia ouvir o seu espectro. Outra coisa não assombrava o autor de “How My Heart Sings!”. Proveniente das mesmas visitas a estúdio – de 1962 – que resultaram em “Moonbeams”, o LP é tido como uma esconjuração de Scott LaFaro, cujo óbito, meses antes, havia devastado Evans. Não obstante a cordata presença de Chuck Israels, é Paul Motian que carrega às costas o pianista, entregue a sombrias harmonizações e improvisações de tão fascinante quão incaracterística frialdade (versões até agora ignoradas de ‘34 Skidoo’ e ‘Everything I Love’ são esclarecedoras). Por fim, “So Much Guitar!”, de 1961, aumentado pelo LP “The Montgomery Brothers in Canada”, e impecavelmente sustentado por Hank Jones e excentricamente comentado por Ray Barretto, é de um genuíno conforto caseiro, com Montgomery, jamais recalcitrante, a patentear um idioma de lacónica adulação, que lhe sobreviveria.

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