14 de setembro de 2013

Mark Dresser Quintet “Nourishments” (Clean Feed, 2013)



Mark Dresser possui um par de álbuns absolutamente inclassificáveis na Tzadik, que batizou como “Banquet” e “Marinade”. Entretanto, no início da década passada, em “Aquifer”, apresentava um tema denominado ‘Digestivo’. E o mínimo que se pode dizer é que, na aparência, este “Nourishments”, em que surge ‘Aperitivo’ ou uma dedicação ao chef Paul Canales – que, após 15 anos no restaurante Oliveto, inaugurou este ano o Duende, ainda em Oakland, privilegiando uma agenda de música improvisada ao vivo no acompanhamento da degustação dos seus pratos –, prossegue uma peculiar preocupação com aquilo que, no limite, anima o trato gastrintestinal. O gesto é eminentemente alegórico. E outra coisa não sugere a natureza-morta de Floris van Dyck reproduzida na capa deste CD, que, a pretexto de retratar um comum pequeno-almoço holandês (c. 1610) encena antes uma liturgia eucarística: atente-se à simbologia transubstancial do copo de vinho, do cacho de uvas ou do pão, repare-se na toalha de mesa branca e no queijo em alusão ao período da Quaresma, na maçã cortada em referência ao pecado original, etc. Ou seja, também Dresser aparece aqui numa surpreendente adesão a um rigoroso conjunto de princípios estéticos e regras composicionais – no caso, do jazz –, naquele que, amiúde toldado por uma capacidade de síntese ligeiramente aquém da ideal, se revela um registo essencial na sua discografia. Dir-se-á que no estelar consórcio que reuniu está a razão para tão grande sucesso – à exceção de Michael Sarin, que alterna a posição com Tom Rainey, os restantes elementos do quinteto, Denman Maroney, Rudresh Mahanthappa e Michael Dessen, lideram projetos noutras edições da Clean Feed. Mas a verdade é que tudo depende destas peças de corajosa construção rítmica, inusitado sentido de estrutura e memorável disposição melódica.

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